Um dos pés calçado num mundo imenso, enfeitado de vida
inteira pela frente
O outro calça o menor dos mundos, azeitado pelo tempo que não
retorna
E, mesmo desengonçada, calçada por mundos tão díspares
A esperança me surpreende com sua elegância e desenvoltura
Ela adquiriu este traquejo ao ver a Virgem Mãe esmagar a
cabeça da serpente,
Cujo veneno era o abandono da capacidade de crer que o veio
do coração humano
Sempre tem uma pedra rara cravada no grotão de seu mistério:
pedra furta-cor,
Que oscila entre tons de maravilhamento e tons de dor
A esperança assistiu ao caminhar de um Menino no calvário
Ele trazia uma pomba branca equilibrada no seu doce olhar
Todo horror e cruz se curvavam diante daquela pomba e
daquele mar
Porque aos pés do Homem que carregava a cruz
Estava uma Criança a espera de um abraço
As mãos daquele Pequeno Rei eram o refúgio onde a balança
Encontrava a calibragem da Justiça,
Os arco-íris o candor da Aliança
E as mãos dadas a mesura da Paz
O mundo pequeno dos enormes desesperos tenta plantar queda nos
pés da Esperança
Mas, o sorriso do Ano Novo que respira a inocência do Menino
Descobre uma tempestade de ressurreição radiante
No último suspiro do Homem
E desta inesperada nascente
A esperança encontrou forças para se reequilibrar
E terminar o desfile mais elegante do que os nuncas ,os
sempres e os talvezes
Foi quando a queda se deu conta de que havia trocado a nudez
da solidão e do medo
Por uma veste ornada com 365 motivos para ficar de pé
Foi aí que a Esperança entendeu
Que a queda era uma pista de decolagem
para seu voo
E, assim, partiu do nosso coração, que era de Jesus, que era do Homem, que
era do Menino
Coração que era mapa de um tesouro que podemos inventar com as cores frescas da Lua,
Imersa em uma luz que lhe é própria porque se doou por completo
Oração que era a chama de um honesto Pulsar
Era e há de ser...
Em 1988, a cantora francesa, Françoise
Hardy, havia anunciado o final de sua carreira. Mas, como todo bom romântico,
ela tratou de convencer o apocalipse a mudar de ideia e deixar o fim para outro
lendemain qualquer. Desde então
gravou pelo menos quatro vezes, tendo seu disco mais recente, L’amour fou, sido lançado mês passado.
As músicas de Hardy resistem à tentação pós-moderna de colonizar
o único terreno que ainda resta livre das naus da racionalização: o terreno da
incerteza e da surpresa ou, em outras palavras, o terreno do coração.
De alguma forma, são canções que nos desafiam a nos
reacostumarmos com a dose de mistério e loucura necessária à manutenção da própria racionalidade. Não seria isto a poesia: um convite ao sincretismo entre a loucura e a racionalidade que nos habitam? Não seria o esforço de divorciar estes dois entes que os tornariam ilhas inóspitas e altamente perigosas?
Parecemos estar plenamente adaptados à
inconstância e à efemeridade, mas agimos como se todas as relações pudessem ser
um esquema onde fossem conhecidos todos os liames entre passado, presente e
futuro. O ciclo das mudanças gira cada vez mais rápido, mas somos imaturos em
lidar com o risco que é inerente aos relacionamentos. Em vez de fazer do risco
um momento de prazer suscitado pelo esforço conjunto de elaborar novas etapas
das relações, preferimos fazer do sintoma motivo para enterrar o doente antes
mesmo que ele morra.
Somos analfabetos no que se refere ao enfrentamento de
riscos. Por nos acharmos capazes de
aparar todas as arestas da incerteza, a frustração mínima se torna motivo de
deflagração do Apocalipse. Achamo-nos pés no chão, uma geração que, ao
contrário das anteriores, não é mais escrava da transcendência, tendo
descoberto enfim como usufruir a realidade, a concretude. Mas, o que há de mais
impalpável e transcendental do que o fetiche do “fim”, do que buscar num beijo
não a boca que se beija, mas todas as outras que porventura poderiam, talvez,
ser beijadas?
Existe um abismo entre o que buscamos e o que achamos no
outro. Novidade nenhuma... O que é novo, na mesmice que fere a poesia de
Françoise Hardy é a pergunta: “Como lidar com o desafio constante de amarmos
numa pessoa aquilo que não sabemos ao certo se é a pessoa?”
alvez o neorromantismo de Françoise Hardy procure um campo
para enfrentar este questionamento, que não sejam as miragens igualmente
transcendentais do eterno e do efêmero.
Pour quoi vou?
Françoise Hardy
J’ignore si ce que j'aime en vous
C'est vous
Mes idées deviennent floues
Je suis à bout
Pourquoi vous ?
Et ce vertige qui me prend tout à coup
Il me viendrait d’où ?
De moi ou
De vous ?
Je me sens vraiment en dessous de tout
Je ne tiens plus bien debout
Sans doute
Un coup
De grisou
Inutile de me mettre en joue
J'avoue
Comme un arrière-goût
D'amour fou
Tabou
N'essayez pas de m'arracher
La moindre bribe du moindre regret
Lever le voile pourrait gâcher
Tout ce qui nous lie de loin pour de près
Je ne viendrai jamais à bout
De flou
Qui brouille mes vœux sur vous
Mais si j’échoue
On s'en fout
Se peut-il qu'il y a l'un de nous
Qui joue
À tendre l'autre joue
Si c'est vous
J'absous
Vous resterez au grand jamais
Le plus brûlant de tous mes secrets
Nous resterons au grand jamais
Loin l'un de l'autre et pourtant tellement près
Chego quase à conclusão (visto que um libriano conclusivo é
um libriano doente!) de que o fim do mundo é um tipo de gênio da lâmpada a
esperar ansiosamente que confessemos vontades estranhas. E, como é sabido por
quem bem o sabe, a estranheza tem um lado encantador e surpreendente. Digo isso
ao lembrar vontades de amigos meus, inspiradas pelos últimos suspiros do
calendário maia. A seguir, listo algumas:
Anderson Lima – vontade de encontrar a receita da piada perfeita e convencer a todos que o riso é mais forte que a vergonha
Anuska Vaz - vontade de reler Os Maias, de Eça de Queiroz, e de, por meio de sua impressionante
fotogenia (de Anuska e não de Eça :P), fazer o fim do mundo sair com cara de recomeço na foto de primeira
página da Esperança.
Amós Andrade - vontade de fazer da simpatia uma dízima periódica, terminada em 99999999999...
Aline Figueiroa - arquitetar uma vingança de raios lunares em cada jardim de Burle Marx, onde não mais fizesse sentido proibir nenhum fruto.
Igor Bandim – vontade de plantar um livro e escrever uma árvore e, antes e depois, compartilhar estas vitórias com os amigos que, mesmo longe, sempre são próximos. Vontade de ler nossas dores secretas até inventar um título que seja capaz de curá-las.
Leonardo Sodré - transformar o azul do céu ou dos mares num tatame (um tato que ame) onde o Aikido possa praticar as pessoas
Boris da Aliança- criar um manual ensinando os franceses a serem o melhor dos brasileiros e os brasileiros o melhor dos franceses.
Marcelo Diniz - ensinar todo aquele que está prestes a cair a se reerguer como um aikidoca e a vencer como um cavalheiro.
Felipe Simões - unir as esferas do dragão para fazer uma festa comemorando sua alforria
Sabryna do Aikidô- fazer de cada nota musical um espetáculo, dos sustenidos mágica e dos bemóis milagres e de toda essa sinfonia plateia que aplaude o coração humano.
Paulo Gurgel - transformar a pobreza num sonho que acorda desabrochado em flor de esperança, solidariedade e paz
Paulo Ricardo Almeida - apagar os incêndios de Ribeirão Preto e do Mundo e convidar a fé e a doçura para andarem na garupa do Grand Canyon ao longo de uma motocicleta.
Renata Scarpin - multiplicar pela clave de sol a luz do Espírito Santo e refleti-la mundo a fora no sorriso da fé.
Mário Daher - ser milionário o suficiente para poder fazer doações a todos os continentes até que a desigualdade se renda ao charme do Aikidô.
Dyego Holanda - escalar o Everest para dar um abraço caloroso no coelho da Duracell e juntos fazerem uma oração pela paz mundial.
Ana Geny - dividir o último gole de alegria infinita com a sedenta justiça.
Carla Araújo - vontade de dar um abração bem apertado no Visconde Partido ao Meio.
Delzuita dos Prazeres Lima - vontade de participar de um passeio ciclístico em Nibiru e ganhar como medalha a paz mundial.
Everson Cavalcanti - vontade de, com categoria, sair correndo, ao mesmo tempo, nu e de sunga branca pelas ruas recifenses. Isso pra servir de exemplo aos que anseiam despir-se dos invisíveis grilhões.
Fábio Soares Nunes - vontade de fazer o cerimonial do Encontro de Paz entre o Oriente, o Ocidente e Recife (o maior continente da América Latina).
Fátima Ferreira - vontade de convidar a elegância para dançar a última
primeira dança ao som da primeira última música
Helga Vieira - vontade de criar o projeto arquitetônico de um lugar
onde os traumas sofridos pelos animais possam ser apagados.
Karla Gisele Vidal: vontade de substituir os exércitos e as guerras por
esquadrões da moda e missões de paz.
Gustavo Táriba - vontade de sabotar a fábrica da coca-cola e
adquirir franquias da grife Star Wars
para propagar o lado áureo da Força.
Juliana Mafra – vontade de desenvolver um software que desprograme
o rancor, a mágoa e o preconceito
Ivana Perobelli - vontade de buscar no 1% de tempo que resta o amor indivisível.
Elizabeth Moura - vontade de ensinar os espíritos tristes a dançar balé para que o cisne branco que neles há ressuscite.
Ozan Revi - abrir uma empresa de exportação, sem fins lucrativos, cujo principal produto é o azul ardente do céu de Recife, que, de alguma forma, mora também nos seus olhos turco-britânicos.
Ana Paula Costa - vontade de que todos tenham a chance de voltar pra casa e encontrem um Eu-te-amo de pé à soleira da porta, despindo-se das luas de saudade
July Holanda – vontade de tocar violino até curar os gritos e
silenciar as dores.
Mauro Torres – vontade de pedir emprestado ao Pequeno Príncipe um
dos cometas que ele guarda na garagem do sonho
Aislam Melo – vontade de promover um acordo de cooperação entre
Nárnia e a vida real
Mariana Silveira– vontade de ajudar a luz a pesar mais que a
injustiça na balança dos destinos.
Sarah Catão- vontade de patentear seu sorriso como remédio para toda e qualquer esterilidade
Lylian Cabral – vontade de não deixar ninguém que ama sem saber
que é amado.
Iara Lima – abrir uma filial da amizade sincera na Zona Franca e instaurar um tipo de comunismo em que todos tenham direito a plena liberdade de expressão e a um
iate particular.
Mahely Barros – vontade de tornar a vida a cara da riqueza, com
direito a limpeza de pele para extrair as marcas da arrogância e da
auto-suficiência.
Wanessa Loyo – vontade de que o sorriso deixe de ser medida
provisória e se torne decreto-liberdade.
Alberes – vontade de pintar com silêncios quadros
impressionistas, fazendo do ser amigo uma rima com a luminosidade.
Augusto Noronha – vontade encontrar carinho e respeito onde
supostamente só havia desajuste e, durante o processo, adquirir a versão
pós-fim-do-mundo de Ghost Recon.
Marluce Vidal – vontade de nos aproximar da canção do Céu.
Noaldo Vidal – vontade de nos tornar felizes vítimas da conspiração
da fantasia.
Luciana Zamprogne – vontade de ajudar os outros a fazerem da
contradição um ato de fé e um gesto de lealdade.
Tony Pradines - vontade de cancelar a reserva no restaurante Leite e ir comer com os amigos um petit gateau de nata-goiaba no La comédie da Via Láctea
Ana Carolina Morais – vontade de plantar uma espada samurai e colher uma
cachoeira de carinho.
Magaly Rocha - vontade de ensinar as armas de fogo a jogar fora o uniforme de guerra e se vestirem como as flores da Holanda.
Iliana Quidute - vontade de cantar com uma multidão uma música esculpida no milagre.
Renata Vieira - vontade de sentar aos pés do sonho e escutá-lo contar uma história para ninar o tempo e de, acordar com vontade de prescrever para todos os impacientes os efeitos colaterais do amor: respeito, idealismo e paz
Renata Marques – vontade de fazer a esperança fluir através dos poros do rosto, hidratando os sorrisos, e dos poros da alma, dignificando as cicatrizes.
Amigos do Aikidô – vontade de treinar até o equilíbrio
energético do planeta ser restaurado.
Cláudio Clécio – vontade de suspender o fim do mundo até seu
Eu-te-amo chegar ao coração do Nobre Alguém.
Augusta Ada Byron não se valeu do renomado sobrenome de seu pai, o escritor ultrarromântico Lord Byron, como senha para entrar para a história. É mais conhecida como a condessa Ada Lovelace. Mas, nesse caso, o sobrenome Lovelace deve a elasua fama e não o contrário, visto ter sido a jovem a primeira pessoa a criar um programa de computador. Atualmente, ela empresta seu nome a uma linguagem de progrmação: a ADA, desenvolvida pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos e utilizada na aviação.
Lovelace não manteve laços estreitos com o pai, que morreu quando ela tinha 8 anos . Só veio conhecer o rosto de Byron, por meio de um retrato, ao fazer 20 anos. Não herdou dele as feridas do "mal do século", mas, certamente talvez, algo do ímpeto byroniano estava em sua personalidade que, desafiando o conservadorismo da era vitoriana, desenvolveu pesquisas junto a Charles Babbage, criador do primeiro computador mecânico.
A mãe de Ada chegou a suspeitar de que sua filha pudesse ser louca. Mas, a moça conseguiu lidar bem isso, convertendo um possível complexo de inferioridade em cultivo da criatividade. Assim, logo cedo, dedicou-se a desenvolver modelos matemáticos para descrever o funcionamento do sistema nervoso.
Chamada por Babbage de "encantadora dos números", Lovelace também despertou a admiração de outros cientistas como Faraday, um dos fundadores da eletroquímica e do eletromagnetismo. Sem sucesso, ele tentou programar um relacionamento amoroso com ela.
Contudo, Ada deu um passo além de Babbage, refletindo sobre a possibilidade da programação em computadores não ficar restrita ao domínio do número, abrangendo, por exemplo, a música.
Lord Byron foi protagonista de inúmeros escândalos, sendo conhecida, por exemplo, sua tendência à necrofilia. Ada não chegou nem perto desta excentricidade, mas manteve relações extraconjugais e esteve envolvida com o jogo. Chegou a se endividar ao investir na construção de modelos matemáticos que garantissem o sucesso na jogatina.
Anualmente, em outubro, é celebrado o Ada Lovelace Day, com o objetivo de promover o trabalho de mulheres no núcleo duro das ciências, a exemplo da matemática e da engenharia. Ada teve três filhos e faleceu em 1852, aos 36 anos.
Sobre Ada, dirá Babbage:
Forget this world and all its troubles and if
possible its multitudinous Charlatans – every thing
in short but the Enchantress of Numbers.
Em nome do ócio e da
amizade, mais recente livro de Saulo Neiva, reúne as pontas soltas de uma
trama que, no século das Grandes Navegações, aproximava as palavras amizade,
ócio e poesia.
A obra coloca em evidência a turbulenta fronteira entre o
território do “Adeus” e o território do “Estou de volta”, fazendo inquietações
do século XXI, acerca da permanência ou do fim de valores como sinceridade e
eternidade, tornarem-se objeto de debate quando refletidas pelas Cartas em Verso, gênero (espelho torto) literário do
século XVI, aparentemente lançado no esquecimento pelo advento do Romantismo.
Neste sentido, a proposta metodológica do autor dialoga com
o universo de Jung, para quem o futuro, tantas vezes, é o movimento de passados
que buscam a superfície do mar da história para tomar fôlego, aproveitando a
oportunidade para mostrar à atmosfera como respirar novos ares.
A Carta em Versos almejou dar forma literária ao desejo de fazer
da palavra uma entidade ao mesmo tempo pública e privada. Algo semelhante ao
que ocorre nas redes sociais, onde uma mensagem, mesmo direcionada a alguéns
específicos, é passível de ser compartilhada por pessoas não pertencentes à
reserva “ecológica” da intimidade. O professor Lourival Holanda, durante o
evento de lançamento de Em Nome do Ócio,
destacou que a escrita de Francisco de Sá Miranda, irmão do governador-geral
Mem de Sá e grande representante deste gênero, em muitos pontos é comparável às
postagens do Facebook, cujo eixo central é a amizade e o ócio. “O que é
diferente da ociosidade. O ócio é a contrapartida do negócio. É um momento em
que a preocupação deixa de ser fazer o mundo girar e passa a ser contemplar o
mundo”, explica.
A esfera do negócio gira em torno do pragmatismo e do
interesse. Conforme a moral da época, inspirada pela herança greco-latina, não
havia aí espaço para a amizade verdadeira, plantada entre aqueles que se
escolhem mutuamente para que, juntos, possam compartilhar do ócio, o espaço em
que o espírito humano se desamarraria das convenções e se permitiria recriar a
realidade, buscando inspiração na companhia daquele (s) com que se escolhe
estar “amigado”.
As imagens alegóricas eram, nesse caso, utilizadas como
veículos a transitar entre um significado “universal” – crido como capaz de
atravessar os tempos – e um particular alicerçado nas preocupações que linkavam
remetente e destinatário.
Talvez este gênero tenha logo esmaecido por não dar conta de
uma angústia que lhe era subjacente e que reinvidica, por meio das redes
sociais, o direito de navegar nos contemporâneos mares do “agora ou nunca”.
Esta angústia diz (des)respeito a coisas que, à primeira vista, parecem banais,
mas requerem uma visita profunda a nossos temores e coragens. É uma angústia
que pode ser traduzida em questões como:
Como devo agir se tenho a meu dispor milhões de amigos em
potencial, mas, não tenho ferramentas para transformar esta amizade em ato?
Como fazer para administrar dentro de mim as vontades
contraditórias de ser eternamente amigo e de colocar novos eternos amigos no
lugar do primeiro?
Como ser ou ter um amigo sincero sob a pressão de uma
cultura ameaçada pelo monopólio exclusivo colonial do interesse (entendido na
vibe de Maquiavel, isto é, como pacto entre meio e finalidade sem direito ao
contraditório)?
Como lidar com o desejo de ser um amigo “eterno” quando a
eternidade é vista como disfarce da obsessão e o carinho como uma espécie de
prelúdio de uma sinfonia de agiotagem?
Como ser digno de ser escolhido como amigo por Alguém?
Uma coisa é (in)certa. O livro, como chama atenção Lourival
Holanda, nos faz pensar sobre nosso relacionamento com as virtudes cívicas:
igualdade, liberdade e fraternidade. “Podemos abrir mão da igualdade, quando
reconhecemos que alguém, por determinados fatores, como a experiência ou a área
de atuação, é hierarquicamente superior. Podemos abrir mão da liberdade quando,
por vontade, ficamos meio que presos e submissos a quem amamos. Mas, não há como abrir
mão da fraternidade, pois sem ela não há possibilidade de convívio nem com nós mesmos, nem com os outros”, conclui.
Mostra-me, amigo, onde está o eterno
Pois, já não me lembro
Mas, ele respira de dentro/fora do mais profundo de mim
Enquanto caminha na corda bamba
Mostra-me, amigo, onde está o não-estar do fugaz
Que me mantém capturado na sombra do seu quase rastro
E na luz do seu eterno despertar
Mostra-me como ter escolha e, ao mesmo tempo,
Ser capaz de ter a tua companhia
Mostra-me como posso me mostrar e continuar
Contemplando o nascer e o se pôr do mistério
E, então, te mostro como, sendo cego,
Posso ser teu guia enquanto me emprestas teus passos.
A Anuska e Gustavo e Saulo e Mahely e Pradines e...
Acusada por muitos de ser uma versão insossa e maneirista de
Anne Rice, Stephenie Meyer montou sua própria mitologia vampírica a partir de
destroços de outras narrativas. Os vampiros da saga Crepúsculo, em alguns
momentos, parecem mutantes dos X-Men: não os mutantes clássicos, a exemplo de
Wolverine, mas os da recente e decadente safra, bem representada pela Shark Girl, nova mutante de origem
brasileira, mais precisamente da praia de Boa Viagem, em Recife.
Porém, algo que encanta nas histórias de Meyer é a sua
coragem de pensar como seria viver a eternidade sob a pressão das demandas do
humano demasiado humano. O maior desafio
de Edward, durante a saga, foi fugir da intensidade do amor de Bella, que vinha
desafiar a calmaria da eternidade com a qual ele estava acostumado. Ele era
capaz de permanecer sem comer ou dormir, pois era imortal. Mas, depois de se
apaixonar, teve a alma invadida por todos os apetites dos mortais. Contudo, o
rapaz estava perdido, pois depois de experimentar tal fome, seria impraticável
ter de volta o deserto da saciedade que sua alma desapaixonada nutria.
Já Bella foi capturada pelo paradoxo. Ao tocar Edward,
sentia o afago que a distância tem a oferecer. Ao receber seu carinho, flertava
com o risco de ser morta, caso o rapaz não conseguisse controlar seus impulsos
vampíricos. A pele de Edward não podia oferecer a ela o calor vital, mas ele
estava lá, como os silêncios sem os quais o ápice das sinfonias seria
impossível. Bella se apaixonou porque, em Edward, encontrou uma fórmula jamais
pensada pelos românticos. Viveu o amor platônico em todos os angustiantes
detalhes da experiência sensorial (na verdade, ultrassensorial).
E, no mar de equívocos em que navega a saga Crepúsculo, os
detalhes oferecem reconfortantes surpresas. É o que acontece com relação ao
personagem Jacob, homem-lobo que, até o episódio Amanhecer, duelava com Edward
pelo amor de Bella. Jacob também experimenta um amor platônico. Mas, como revela
o final da saga, o personagem ama, em Bella, a presença de alguém que ainda
viria a existir. É uma impressionante metáfora. Jacob faz jus à ideia do amor
eterno, tão eterno que se dá nos dois sentidos da trajetória do tempo. Sua
amada é por ele amada antes mesmo de nascer.
Na verdade, em Amanhecer, ocorre um tipo de curto-circuito
do amor platônico. Quanto maior parece ser a distância entre os amados, mais
palpável parece ser a proximidade entre eles, como se toda a energia dos cinco
sentidos migrasse para um tipo de toque extrassensorial que faz da ausência uma mão a mais na hora do
abraço, um olhar a mais na hora da contemplação, um minuto a mais na hora da
eternidade.
Lapidei a raridade
E, vi que o caminho que lá se escondia,
Conduzia ao teu coração
Que, mesmo nos lampejos de brutalidade,
Faz a pedra mais preciosa corar de vergonha
Quando tu voltas a falar comigo,
Percebo porque a gratidão merece não ter preço
No dia de ação de graças,
O mar deságua nas minhas vertigens
E suas ondas já não sabem como agir
O melhor que elas têm conseguido é sentir saudade
E agradecer a Deus por ter aberto mão do dinheiro
Para me dar de presente tua presença
E me honrar com este brilho que ensina a prata a brilhar
Com esta sombra que renova as luas e os anoiteceres
Com este tempo que me dá a alegria de nascer
Para ser grato à distância
Cada vez que ela desiste de me separar de ti
Os atores Cláudio Fontana e Marcelo Antony na peça Macbeht, de Shakespeare
Fazer uma crítica é, em errada medida, apresentar
nossas expectativas a nossas frustrações. Outra forma de definir a crítica
seria como o trajeto entre uma observação prévia – venenosa e imprevidente – e
uma futura observação revista e prudente. Mas, certamente talvez, a crítica, e
no caso da crítica teatral essa característica se torna marcante, tem como
função romper as amarras de perfeição e da completude, que ameaçam estrangular a
obra. A crítica devolve ao espetáculo a capacidade de voltar a ser ensaio.
Passeei por todas as definições de crítica, mencionadas
acima, ao assistir à leitura que Gabriel Vilela deu a Macbeth, texto de Shakespeare, cujo personagem-título foi interpretado por
Marcelo Antony no palco do Teatro Santa Isabel, em Recife.
Ao chegar ao teatro, crítico inexperiente que sou, acionei uma pequena
dose de veneno adoçada por uma quota de irresponsabilidade. Disse
então, antes de o espetáculo ter a chance de dar o primeiro suspiro:
- Que cenário interessante, apesar dos garrafões de água
mineral localizados ao fundo.
Observação idiota. A mesma coisa de
dizer que As Meninas, de Velázquez, é
um quadro fantástico, apesar de o pintor ter deixado, no quadro, a porta aberta...
Em seguida, a peça começou e, conversando com os botões que
fechavam o traje do silêncio, fiz outra observação menos idiota:
- Marcelo Antony está um pouco estranho. Ele foi uma das
melhores interpretações de Pilatos na história do espetáculo da Paixão de Cristo em Nova
Jerusalém. Mas, como Macbeh parece meio “canastrão”.
O dia seguinte viria me provar, assim como provou a Lady
Macbeth, que minha teoria estava errada. Mas, em vez de me jogar da sacada do
primeiro andar, escrevo esta crítica para lavar as idiotas precipitações que
escorrem das mãos de um crítico cultural.
Na saída do teatro, fui apresentado por minha amiga Anuska,
a um grande estudioso de Shakespeare: João César de Castro Rocha. Ele nos
perguntou se havíamos observado como, no decorrer da peça, as expressões
corporais de Macbeth iam se tornando mecânicas, como se sua autonomia desse
lugar à gestualidade de um boneco. Bem observado: o Macbeth de Marcelo Antony,
por força da pressão interna de sua ambição e da pressão externa por se adequar
às expectativas alheias, torna-se um títere (não à toa deve ter sido a escolha
de Shicó do Mamulengo para fazer os figurinos e adereços da peça).
Cogitei a hipótese de que o falar do ator remetia ao
trejeitos artificais do falar dos mamulengos que se apresentam para as crianças
no Nordeste. Isso, quem sabe, misturado à afetação e aos maneirismos que davam contorno aos gestos das cortes em fins da Idade Média.
Então percebi quão digno era o esforço de Antony, um grande
ator, para emprestar artificialidade à voz e aos gestos, reservando a carga
dramática para os detalhes. A artificialidade, nesse caso, dava mostras do
desespero de alguém que não pode ser ele mesmo
de tão ético que é. Sim, Macbeth é tão ético que tenta a loucura de
satisfazer, ao mesmo tempo, as demandas da sociedade, dos deuses (ou demônios),
de seu coração e de sua esposa (uma mistura das demandas listadas
anteriormente).
Macbeth é lido pelo diretor Gabriel Vilela como uma espécie
de Pinóquio que decide deixar de ser menino para se tornar boneco. E Lady
Macbeth é a rainha das fadas virada ao avesso e conspirando para que o
personagem deixe o nariz crescer até se tornar afiado o suficiente para assinar
com sangue a proposta que viria a ser feita por Maquiavel de, em nome da
vitória no jogo político, trancar fora de cena o escrúpulo e o moralismo.
Numa alusão ao já mencionado quadro de Velázques, Macbeth
torna-se refém da própria imagem e acaba preso na sua própria pintura, donde,
como uma pervertida mistura de Dom
Quixote e Dorian Grey, enfrenta seus inimigos. Antes, havia vencido exércitos,
mas, acaba sendo derrotado pelo maior exército do mundo, constituído de um só
soldado: a culpa.
A leitura que a montagem deu às bruxas que prenunciam o
destino de Macbeth traz à peça um humor que causa desconfortante alívio: muito
bom!
Porém, como de costume, a personagem mais cativante é Lady
Macbeth. A alma dela torna cativo o Macbeth que mora em cada um de nós. E as correntes
deste cativeiro ganham um brilho reluzente com auxílio da interpretação de Cláudio
Fontana. Só uma atuação marcante como esta para fazer esquecer o trauma de
ter visto Lady Macbeth ganhar vida na pele de Vera Fisher...
A Lady Macbeth da montagem de Gabriel Villela traz nos
passos uma gueixa, nas atitudes a revolta de Lilith e nas mãos o sangue que
Caim fez derramar, sangue que não para de clamar dos confins do mundo. É uma dama bretã com
feições do teatro Kabuki . Fontana encontrou no homem a pulsão ardente da
mulher e na mulher a pulsão ardente do ser humano.
A esta altura, espero já ter deixado para trás as observações venenoso-irresponsáveis,
dignas daquele tipo de crítico que analisa uma obra como um quiromante que lê a
palma do próprio furico.
Sim, não me esqueci dos garrafões de água mineral. Eles têm
função cênica. Quem viver para assistir ao espetáculo verá!
Que pena ela ter enxergado a vida como um deserto e ter
feito do cafajeste do Rodin a última coca-cola .
Camile era expert em
esculpir miragens e não teve coragem ou não teve medo o suficiente
Para, em vez de se tornar esquizofrênica, ter dito a Rodin:
- Pô, velho, você é um idiota. Eu ainda te amo, mas, não faz
mal, o amor vai ficar cicatrizado e logo chegará o século XX e eu poderei
cantar a música de Ivan Lins que fala sobre corações que de tão cicatrizados
nem parecem que foram colados.
Rodin não teve culpa. Nem Camile.
Que pena que Camile levou a sério alguém que a chamou de
desequilibrada
Que pena que Camile decidiu desconfiar do mundo inteiro
Tá certo que o mundo não merece lá muita confiança
Mas, quem desconfia de tudo perde a chance de achar a
alegria da surpresa
Dou, nesse instante, as mãos a Scarlet O’hara e digo:
- Nem que eu tenha de matar, trair, roubar, enganar e torcer pelo
Náutico... Jamais me apaixonarei por alguém que questiona minha sanidade
novamente .
Putz, esqueci-me de que jurar é um pecado mortal
Mas, não faz mal: Ontem é sempre um novo dia que costumamos
disfarçar de amanhã
E já rezei tantas vezes o Ofício da Imaculada, que devo ter
300 mil milhas de indulgência
E não corro o risco de ficar desamparado pois, graças a
Deus, minha conexão com o Céu
Não é feita por
nenhuma operadora de celular fiscalizada pela Anatel
Rodin, só por hoje, só para que eu possa redimir um pouco a
tristeza de Camile Claudel,
Quero te dizer: Vá para o diabo que o carregue, seu covarde,
Camile Claudel foi idiota, mas era uma idiota linda
Pena que não deu continuidade à sua maior escultura: “Rodin indo para o raio que o parta”
Camile Claudel esculpiu em parceria com Rodin A porta do
Inferno
E ele não teve a decência de convidá-la para sair...
Mas, não foi culpa dele, nem dela
Pois, quem pode moldar a escultura de tempestade que Cupido
fez
Quando a fábrica do amor suspendeu a produção de flechas?
Camile, você era linda, mas, infelizmente, a psiquiatria da
época era precária
E você não teve chance de conhecer a Chapada Diamantina
Quem dera eu pudesse pedir a Pigmaleão para corrigir as
falhas da escultura dO Pensador
Para que ele pudesse te ver e te oferecer um jantar à luz de
galáxias
E depois vocês fossem para a cama e colocassem um belo par
de chifres em Rodin
Meu Deus, como seria delicieux!
Sim, Rodin era um gênio
Mas, a história certamente cometeu uma injustiça,
Pois o verdadeiro autor da escultura Os amantes foi Camile
Claudel.
De início, ri muito quando li, no Facebook, uma análise
psicológica que foi feita do perfil do “cara” da nova música de Roberto Carlos:
“Esse cara sou eu”. Mas, o riso fácil é um tipo de diagnóstico que comumente
requer uma segunda opinião.
A análise psicológica, reproduzida ao fim da postagem,
afirma que por trás do perfil romântico que Roberto Carlos desenha na canção
mora uma espécie de maníaco obsessivo de quem se deve fugir.
Pelos mil nomes de Nossa Senhora! Tudo bem não gostar da música,
achar que ela é piegas. Mas, reflitamos sobre a corrente mania das pessoas de
querer encontrar em qualquer ato, palavra ou omissão um indício de que o
Esquadrão da Moda deve se colocar a postos com camisas-de-força.
Machado de Assis escreveu o conto O Alienista em 1882, mas
nunca ele esteve tão atual. O conto fala sobre como o impulso de procurar a
loucura nos mínimos gestos dos outros pode levar o próprio dono deste impulso à
loucura.
Mas, vamos à poesia de Roberto Carlos. Como poesia, ela é o
que os teóricos da literatura e das artes chamam de ato de fingir. Fingir que
envolve a dissimulação, mas também a doçura, a alegria. È um fingir em que o
artista se esforça para reescrever a realidade e não para reproduzi-la. E mesmo
que ele queira iludir-se de que é capaz de reproduzir a realidade com base na
evidência, não será capaz de reproduzir a unicidade dos momentos, que pertence também
ao terreno do invisível.
É o fingimento poético que permite experimentarmos a dor, a
mentira, o ódio sem que estes sentimentos precisem se tornar fatos.
É o que acontece na poesia de Roberto Carlos. Ele pode não
estar amando ninguém, mas, no texto poético, ele ama um alguém que é feito por
todos os outros alguéns que ele amou ou por nenhum deles em particular.
Tudo bem querermos ser reservados, introspectivos e fazer do
“I wanna be alone” um estilo de vida. Mas, é um pouco irritante a ideia de
pensar que não podemos olhar para alguém ou elogiar ou tocar o ombro da pessoa
sem que sejamos confundidos com um Drácula de Bram Stoker que quer tomar posse
da alma e do sangue alheios.
Aviso aos navegantes da racionalidade tacanha e aos
ignorantes que tomam overdoses de senso comum a bordo da nave do sentido
literal : Esse cara sou eu é composta de hipérboles. Não me vão fazer,
como já ouvi num programa de rádio, de comentar sobre a suposta insensatez de
Roberto Carlos ao escrever “Eu quero ter um milhão de amigos”. Pelo lado áureo
da Força: Ter um milhão de amigos é uma metáfora!
Ninguém “conta os segundos” quando alguém demora
Alguém que chama o outro no meio da noite pra dizer que o
ama, fará isso só numa ocasião especial em que quer ser poético. Não se trata
de um transtorno obsessivo compulsivo (TOC).
E, saibam os arautos da racionalidade, que toda pessoa tem
algum grau de TOC. Paremos com o mau-costume de sair por aí acusando os outros
de psicose. É feio, galera! Além de
tudo, o povo não sabe o que é psicose e fica por aí dizendo que alguém é
psicótico porque contratou o carrinho de som da telemensagem. Essa pessoa é no
máximo inconveniente, porque um psicopata, como é sabido por quem bem o sabe,
não esboça emoções.
Deixemos Roberto Carlos e o cara que ele é em paz#pelamordedeus. E, façamos um curso de
reciclagem poética, para deixarmos de ocultar sob o véu da racionalidade a paranóia
contemporânea de nos colocarmos na vibe de chapeuzinhos vermelhos e acharmos
que o carinho e a poesia – por mais escassos que estejam no mercado – são
armadilhas de lobos-maus e obsessores.
O melhor remédio para a insônia é assistir a algo que faça o
sentimento surpreender o seu proprietário (o coração). O pior, porém eficaz, é
assistir a algo que não convença, como os últimos capítulos de Avenida Brasil.
Heloísa Perissé se esforçou, mas sua atuação não conseguiu
convencer que a personagem Monalisa continuava amando Tufão. Afinal, ela havia
passado a novela inteira convencendo o público de que seu amor não era mais
Tufão, mas sim o personagem Silas.
Monalisa reconquistou o amor de sua vida com um carro de som
que oferecia um serviço de telemensagens. Nessa hora, cheguei mesmo a acreditar
que os dois se amavam, pois só um amor a altura do livro bíblico Cântico dos Cânticos
para resistir à provação de ser torturado pelo carro de som da telemensagem. Se
bem que minha mãe ficou emocionada quando eu contratei esse serviço para
homenageá-la em seu aniversário.
Mas, o autor da novela poderia ter misericórdia e, ao menos,
compor uma poesia para ser veiculada pelo carro de som. Algo mais ou menos
assim:
“Quis acreditar que havia deixado de te amar porque tinha
medo de fazer o caminho de volta antes que meus calcanhares de Aquiles
cicatrizassem das flechadas que partiam do arco do engano”. Tipo: é meloso, mas
ameniza o pânico propagado pelos alto-falantes do carro de som.
Tufão também não colaborou para que o clima de romance fosse
convincente. Melhor dizendo, quem não colaborou foi a atuação de Murilo Benício
que transformou Tufão numa descompromissada brisa: saudades eternas de sua
performance no filme Amores Possíveis...
Coerente a revelação de que Carminha matou Max. Coerente
como a composição química de um sonífero. Mesmo a visceral interpretação de
Adriana Esteves não convenceu ao tentar passar a mensagem de que Carmem Lúcia
se arrependera. Marcelo Novaes também não colaborou, pois sua interpretação de
Max daria motivos não para que o personagem fosse assassinado, mas sim para que
fosse exonerado.
O pedido de perdão de Carminha talvez tivesse convencido
mais se ela houvesse feito uma oração. Algo do tipo:
“Queria não me chamar Carmen Lúcia por alguns instantes e
esquecer como se pede desculpas e olhar para trás e não ver crimes, mas apenas
equívocos; não equívocos, mas somente mal-entendidos; não mentiras, mas só um
desejo de ter podido ajudar tua solidão a ser menos só e te pedir que tua
companhia ajudasse minha companhia a ser menos egoísta, exigente e, quem dirá,
afixiante...” .
Simplesmente deixaram para lá a hipótese de que Nina
sofresse, mesmo que de leve, de um transtorno bipolar. Não convenceu!
Talvez o capítulo tivesse sido mais interessante se tivéssemos
tido a chance de ouvir uma oração de Carminha e outra de Nina. Algo como:
“Quero que um anjo te visite e diga que o bem que tento
fazer por ti secretamente não precisa te causar medo ou espanto. Fiz o bem (esta
foi minha maior ambição depois de acreditar na esperança). Agora, me despeço
sem esperar que a novela acabe”.
Toda vez que tu retornas meu peito levanta voo
E toda minha doença fica no terminal de passageiros
A cura não vem sem dor e, para desespero da saudade, não está de passagem
Veio para ficar, como uma cigana que monta prisão perpétua no chão incógnito da liberdade
Quando, mesmo sem ir te buscar,
Chego na hora exata de te encontrar
Embora a falta que sinto do abraço que não me deste
Chegue adiantada
Enquanto o abraço que sonho te emprestar
Sempre se atrasa e deixa de cumprir seu descompromisso
Não vou te dar um abraço
Vou te emprestar um
Para ter o pretexto de que me devolvas este abraço com juros
E prometo que o juro do abraço é a graça de um beijo
Cada vez que te reencontro
Agradeço por teres aterrissado em segurança,
Um Alguém tão lindo: que faz a mais linda paisagem
Pecar por falta, virando esboço
E salvar-se por excesso, na medida certa da utopia
Winsor McCay foi o primeiro a desenvolver uma técnica para
animação de desenhos, tendo inspirado artistas como Walt Disney e Walter Lantz
(criador do Pica-Pau). Mitologia, no sense, estética surrealista e um algo de noir marcam sua obra. McCay também gostava de promover contrastes entre a inocência e a monstruosidade, criando seres fofinhos, mas capazes de causar, despretensiosamente, grandes catástrofes. Mais tarde, estas criaturas do imaginário do cartunista viriam a inspirar a feitura cinematográfica de personagens como King Kong e Godizilla. Contemporaneamente, reflexos destes seres podem ser encontrados em personagens dos mangás e dos animês.
McCay também fez a animação The sinking of the Lusitania, com motivação ideológica, a
fim de estimular a entrada dos Estados Unidos na I Guerra Mundial e incitar o sentimento de anti-germanismo.
O trabalho de McCay provavelmente encontrou inspiração na obra do cineasta Georges Méliès.
Robert Winsor McCay Jr., filho de MacCay, também se tornou um cartunista de destaque e especializou-se em colorização, trabalhando para editoras como a Detective Comics (DC).
O google criou, no dia 15 de outubro de 2012, um dos mais instigantes doodles que já existiu até o feriadão de 12 de outubro, em homenagem a MacCay. Ele pode ser visto no vídeo a seguir (melhor, só o doodle do trigésimo aniversário do Pacman!):