Por causa de orgulho ferido ou de teimosia cicatrizada
Tu és a inspiração para meu não-desistir
E o não-desistir que teu lindo rosto me traz
Não é composto de obsessão
(de um pouco de aflição, certamente talvez)
O não-desistir de ti é feito de silêncios de cabelo
assanhado,
Do prazer de poder esperar pelo retorno de quem quer
retornar pra mim
E meio que não sabe como
E da timidez mais cativante que já se exibiu nos palcos do meu sortudo destino
E dum abraço onde podes esquecer os engenhos, as heranças
E encontrar a riqueza do minifúndio de um cheiro bem
apertado nesse rosto Nobre e encantador
Como esquecer facilmente quem me ensinou a amar em silêncio?
Por que me sinto importante para ti
Quando a evidência trazida pelas opiniões dos amigos e dos
não-tão-amigos-assim
Insiste em me fazer crer que sou pra ti um nada e que és pra mim uma ilusão
despropositada?
Nessa hora, entra em cena a fé
Porque a crença no invisível me traz nítido e brilhante um
Eu-te-amo
Que nenhuma opinião alheia consegue ofuscar
Mas, isso é tranquilo
Porque se eu estiver enganado,
Deixo que a esperança continue sua viagem na garupa das
minhas solidões
Que não são só minhas, mas de tantos olhares sem pouso que
vejo gravitarem pelos Recifes
E pelos mundos adentro
Nem acredito em vidas passadas
Então, por que a saudade que mora nos meus descampados
Traz nas mãos uma procuração assinada por vidas mais antigas
Que os desertos dos quais foi tirado o amparo do dilúvio?
Não me envergonho de trazer um abraço que é teu e não pode
ser de nenhum outro,
Meu Nobre
E a lembrança de teu rosto me ajuda a enfrentar
As intempéries da mesmice que se precipita sobre minha
poesia
Quando tiveres um tempinho, conversa comigo
E, não viaja sem que eu te dê um abraço
Pois não importa as mentiras ou verdades que tenham te dito
a meu respeito
Ou que me tenha dito eu a teu respeito
Ou que tu te tenhas dito a meu respeito
Porque te amo a despeito de bússola, atestado ou
veredito.
Ouvi muito frases do tipo: Ontem todos no Recife eram um só
coração, uma só voz, uma só luta!
Não, a beleza do que aconteceu ontem não está numa suposta
homogeização coronariana da população. Bonito foi ver apenas vinte centavos
tornarem-se uma fortuna, desfiados como contas do rosário das diversidades.
Geraldo Vandré foi o grande homenageado, pois sua profecia
se concretizou: as flores, não só venceram como fizeram murchar os canhões. Outra
homenageada foi Jan Rose Kasmir, que ameaçou as forças armadas do Pentágono com
une petite fleur blanche.
E a inteligência subestimada dos
pernambucanos-brasileiros-latinos-americanos fez conexões que, há muito,
mereciam ser feitas: como a de que não se pode pleitear a democracia num país
em que se propõe que o ser humano seja curado do direito de existir.
Quanta tristeza assistir desavisados apoiando a extinção da
homossexualidade, enquanto seguem tomando no cu imposto atrás de imposto,
assalto atrás de assalto, engarrafamento atrás de engarrafamento, Upa atrás de
Upa: centavo atrás de centavo.
Eram vários corações batendo em ritmos os mais diversos
transformando em trocado os impulsos fascistas de uniformização das atitudes
que alguns canalhas querem acrescentar ao absurdo rol de impostos que oprimem a
nação. Se rasgar dinheiro é coisa de doido, então eram muitos doidos que
estavam ali, porque rasgaram vinte centavos e, com os destroços, criaram
alimento para 50 mil (?)
Che Guevara tremeu de alegria em sua morada celeste, pois seu lema era
texto implícito de todos os cartazes que povoaram o protesto. Havia ternura na
atmosfera. Não havia pensado que viveria para estar numa manifestação onde as
pessoas pediam licença umas às outras. Não houve rendição nem à violência nem à
tendência, à brasileira, de transformar tudo em carnaval para, no dia seguinte,
retornar ao conformismo que nos reduz a cinzas de uma apática quarta-feira, que
acha normal não ter o que comer, mas afirmar que dez centavos é nada.
Um rapaz foi espancado por um infeliz. Mas foi amparado por
um cordão de isolamento composto de manifestantes, que não abandonaram o
cenário do crime, como é nosso hábito fazer, entendendo que a violência e a
miséria não teriam nada a ver conosco a não ser quando arrombam a porta de
nossas casas.
Cantou-se o hino nacional. Não em memória do fascismo do
Movimento Integralistas, mas sim para desintegrar as memórias dos fascismos que,
centavo a centavo, são destilados em nosso dia a dia e, disfarçados de atitude
banal e corriqueira, ancoram nossas mentes à mentira de que é nosso destino
sermos uma pátria de degredados, condenados à miséria, ou de degradados,
condenados a almejar como mérito a vantagem escusa e o compadrio. Ah,meu amigo,
pegue seus vinte centavos e coloque no SUS!
Encontrei um grupo de amigos do Aikidô, no caminhar pela Boa
Vista rumo à Aurora. Não era mera coincidência, visto que Aikidô é uma luta que
abre mão da violência para vencer o “adversário”, ensinando-o o melhor jeito de
cair. Sentia nas pessoas essa vontade de ajudar uns aos outros a cair,
transformando a queda em plataforma de voo: Seria este o traje que a esperança
desfilava naquela tarde efervescente de véspera de inverno.
Tive o desejo egoísta de converter aquele momento em
eternidade, mas não seria justo, pois é muito lindo sonhar que as pessoas têm o
direito de construir seu próprio caminho com direito aos descaminhos que dele
brotarem.
Seis da tarde: a hora do Ângelus. No furacão dos meus
pensamentos, o Nobre Alguém era uma brisa ranzinza que protegia meu caminhar (e
que, talvez e infelizmente, não tornasse a ver). Eu não trazia cartaz, não
pintei a cara, mas o meu coração trazia escrito um pleito que pedi emprestado
de uma música de Zélia Duncan: “Por favor, não vá ainda. A noite é linda: me
espera adormecer”. Queria que este Alguém não deixasse de fazer parte da Nova Aliança.
Mas, o que mais quero mesmo é que, onde quer que seus passos estejam, seu
espírito traga um cartaz onde a felicidade estampada seja tão grande que não
tenha palavras para se expressar.
Guerreiro, vândalo, terrorista, herói. Estes termos têm se
confundido no imaginário da população, reduzindo o valor dos esforços humanos a
triviais metáforas bélicas costuradas a referências ultrapassadas do comunismo
e do totalitarismo. É um tipo de surrealismo às avessas.
Manifestantes e policiais de butique compõem um quadro surrealista
em que a liberdade traz numa das mãos gás lacrimogêneo, noutra vinagre, noutra
a herança que tenta desesperadamente combinar a “cordialidade brasileira” ao “autoritarismo
colonizador”.
Gilberto Freyre chamava atenção para esta tendência ao
mencionar como, na Casa Grande, num instante a Sinhá era íntima da mucama e,
logo em seguida, arrancava-lhe todos os dentes, com um alicate e a ponto cru,
movida pela suspeita de que a referida mucama pudesse lhe querer roubar o
marido.
Salvador Dalí - The Dust of Souls - Releitura de O Inferno de Dante
Coisa semelhante, dada a devida proporção, passa-se no
episódio de São Paulo. Tanto policiais quanto manifestantes encontram seu desejo de liberdade pousado na areia movediça do autoritarismo.
O pior é que, diante da indecisão entre a cordialidade e o
autoritarismo, instala-se a covardia e abrem-se às porteiras para as mais
terríveis pulsões inconscientes, como a tortura e o linchamento. A violência,
nesse tipo de manifestação e, independentemente de que lado parte, deixa de ser
regida pelo tradicional binômio ataque-defesa e passa a ser regida pela lógica
do carcará: “pega, mata e come”. É uma violência, por um lado, com um quê de
vingança contra as carências e as estiagens impostas pela existência, e, por
outro, nutrida pela arrogância e “auto-suficiência” dos senhores de engenho que
desejam eliminar, de uma vez, a ameaça para poderem retornar para a rede e lá
ficarem comendo, peidando e sendo abanados (adulados) pelos escravos: Foi
Gilberto Freyre quem disse...
E nem o pobre cachorrinho escapou, sendo atingido pelo spray
de gás lançado por um policial que deu vazão à parcela autoritária de nossa
herança colonial...
A vanguarda surrealista tinha por vocação descondicionar a
razão de seu potencial autoritário. Fazia isso por meio do que Salvador Dalí
chamou de método hiperestético paranoico-crítico. Isto porque, como um tipo de
antena paranoica e também parabólica, procurava conexões de sentido que
desafiassem a ditadura dos logicismos institucionalizados pelos poderes e pelos
pudores.
O surrealismo d’aujourd’hui
continua sendo um método paranoico-crítico, mas, abrindo mão do
potencial estético que confere doçura à paranoia e sensibilidade à crítica,
acaba por se tornar uma máquina criadora de monstros que são uma hedionda
mistura de razão e desrazão.
Assim como Dalí recriou o Inferno de Dante, por meio de sua
paranoia crítica, as manifestações de São Paulo fizeram algo semelhante. Mas,
parece que contentaram-se em ter como paraíso um estranho vaivém entre um dissimulado purgatório e um mascarado
inferno.
Na próxima postagem, falaremos sobre a releitura de Dalí
para o Inferno de Dante, conjunto de imagens que está em exposição no Recife, no Centro Cultural Caixa Econômica até julho.
Na narrativa de Saint Seiya, a deusa Atena é perseguida pelo
restante do panteão grego por ser considerada uma obsessiva. Motivo: compartilhava
dos valores do Romantismo, como a ideia de tirar um dia na semana para amar sem
querer algo em troca ou acreditar que a humanidade não deva ser destruída:
oferecida em sacrifício em homenagem a Malthus.
Os demais deuses, em particular Hades, acham que os seres
humanos devem ser destruídos e que se deva criar uma nova humanidade do zero
ou, melhor ainda, que o cosmos passe a ser habitado somente pelos deuses num
apoteótico rendez-vous.
Por trás da ficção, um conflito ideológico que assola a
contemporaneidade “dos dias de hoje”: ser o plausível ou ser o sensível.
Certamente talvez, estas não são opções mutuamente excludentes, mas, muitas
vezes, têm sido tratadas como se o fossem. Neste caso, considera-se plausível
não ser sensível ou, considera-se que o amor e seus derivados são distúrbios
enquanto fechar-se em si mesmo seria razoabilidade.
De qualquer forma, os limites entre o sensível e o plausível
são matéria-prima indispensável para as artes e a literatura. Nesta postagem,
veremos alguns casos em que a arte explora, ora com humor, ora com seriedade, o
conflito entre obsessão e razoabilidade, tendo o amor como fio condutor desta “disputa”.
Romeu e Julieta - Emblema máximo do conflito entre amor romântico e obsessão
Dalida - Bang Bang
Nancy Sinatra - Bang Bang
No mito, temos Narciso e Eco, Cupido e Psiquê
Narciso y Eco, pintura de John William Waterhouse
Selena Gomez – Humor noir e cáustico para abordar a questão
do momento em que o amor romântico descamba para a obsessão
Clarice Falcão e sua Monomania também levam para o lado do humor a tendência
contemporânea de considerar os gestos de amor como distúrbios obsessivos
Piaf
Razão e Sensibilidade – baseado no livro homônimo de Jane
Austen. Trata com leveza as fronteiras entre estes dois sentimentos, buscando
os momentos em que tais fronteiras se tornam borradas. Pela milionésima vez sou
levado a citar Gramisci, para quem não há sequer a razão. Para o pensador, a
razão seria uma paixão tão intensa que abriria mão de sua própria chama em nome
de seus propósitos.
A escrita de Haroudo Xavier, no blog Devoras, aproxima RPG, literatura Fantástica e cultura Cyber Punk e mistura tempos "díspares" como Idade Média e Grécia Antiga para falar sobre o diálogo entre amor e obsessão.
O Único
Jogo
"No, I
don't wanna fall in love
No, I don't
wanna fall in love
With
you"
- Wicked
Game, Chris Isaak
O sorriso fácil, a voz doce.
Era tudo tão óbvio.
Ela jogava com as peças brancas, sem sequer estar definido o
jogo.
E4.
Ela sentou-se na mesa com uma amiga.
Elas sequer olharam para mim. Mas tudo começa assim, ninguém
conhecendo ninguém.
C5
Não sou tão fácil, acho. Sento próximo, mas não olho para
ela. A amiga, essa é a presa. Ela, ainda sem olhar para mim, conversa com a
amiga, distraindo-a. C4
Chamo o garçom, falo alto.
Ela olham.
Me arrisco, mas o jogo realmente começa.
F6, E5
Olho para ela. Prestam um mínimo de atenção, e voltam a sua
conversa.
Não vai ser uma noite fácil.
E6, Qh5
O garçom chega. Decido forrar o estômago, peço uma comida
antes da cerveja.
Tento escutar o que elas conversam. Ligo para um amigo, não
quero ir ali solo.
G6, exF6
- Fala, Cabra - Béé! - Tudo bem, Eric? - Tudo, e aí? - Aí
que to vendo duas gatas. Mas não quero chegar sozinho, e aí? - Não dá, Roberto.
Celina tá vindo aqui hoje. - Beleza, beleza. Até mais então. - Até, boa sorte
aí. O destino jogou por ela. Qxf6, Nc3
E mal.
Percebo quando ela me olham ao telefone, mas, tenho certeza,
não me escutam.
Ainda estou no jogo.
Gxh5, Nce2
Vou abrindo o jogo.
Olho para a loira. Mas sempre, sempre preferi as morenas.
A minha comida chega e peço a cerveja, e percebo, agora ambas
olham.
Bh6, Ng3
Há uma dança de olhares, sem posições fixas.
Há uma certa confusão, cada um se protegendo como pode.
Qh4, a4
Elas comem e bebem.
Minha cerveja chega.
Outros homens também olham para elas. Eu devia ter notado
eles antes, fui amador.
Agora, tenho de ter paciência. Ou não. Estou confuso.
Maldito Eric.
Nf6, a5
Há muita gente jogando, cada um se guardando.
A banda começa a tocar.
b6, d3
Me arrisco. Me levanto e vou até lá.
Os caras olham, eu os ignoro.
A meninas me olham com alguma expectativa.
0-0, Nxh5,
Nxh5
- Tudo bem? Posso sentar com vocês?
Meu melhor sorriso, a voz adestrada, o olhar com grau certo
de interesse e até, fome, mas sem exageros.
- Pode.
A loira diz, fingindo desinteresse e cortando a morena, que
sei, ia rejeitar.
Nh3, Kg7
É um momento difícil. O cotidiano que tem de ser
interessante.
A luta contra o som alto.
E ouvir, ouvir. Sempre ouvir.
axb6, Nc6
Elas são simpáticas. A morena, vai cedendo.
Talvez seja a bebida, talvez seja eu.
Mas nesse jogo, não sou de contar as bênçãos.
Be2, Kg6
Ambas são bonitas, inteligentes.
A loira mora perto. A morena, não, mas eu moro.
A noite desliza, suave entre os sorrisos.
Bxh6, Kxh6
Ambos fazemos concessões.
Uma verdade aqui, outra ali, em meio aos disfarces, as
máscaras.
Elas sabem onde moro, que tenho um filho, minha idade,
alguns gostos.
E vou, devagar, avançando.
Rxa7, Nxa7
É um jogo ganho, sem surpresas.
A loira vai ao banheiro. A morena, quase vai.
Discreto, pego sua mão. Ela fica.
O beijo só termina quando a loira senta.
Nf4, Nxf4
Conversamos mais.
A loira, esta visivelmente decepcionada.
A vela queima a mão.
Lembra de um compromisso, nos deixa a sós.
Bd1, Nxg2
A morena é linda.
Com ou sem óculos.
Com ou sem roupa.
Com ou sem... Tudo.
Kf1, Qxf2
Cheque-Mate.
Mas me arrependo.
Tanto esforço, para ganhar e só agora percebo.
Quem ganhou, foi a Rainha.
Procurando Nemo – Clássico infantil, que também brinca com
as fronteiras entre insistência e desistência que tornam nebulosos os limites
entre procura e obsessão.
Em Algum lugar do Passado – Um filme (também livro) que
acrescenta ficção científica ao conflito entre amor romântico e obsessão
Pollyana – O jogo do contente é uma forma sutil e requintada
de pensar a relação entre obsessão e amor. Pollyana é obsessiva, mas sua obsessão, estranhamente
trabalha para que suas “vítimas” sejam livres.
O Pequeno Príncipe – O triângulo amoroso Pequeno Príncipe,
Rosa e Raposa reflete, de maneira alegórica, sobre a dança dos lugares no
conflito entre razão e amor. Em relação à rosa presa numa redoma, o Pequeno
Príncipe pode ser considerado “obsessivo”.
O jogo se inverte, porém, quando pensamos na relação entre o Príncipe e
a Raposa.
Vestígios do Dia – Soma-se ao debate sobre as fronteiras
entre amor e razão, o debate sobre a relação entre satisfação e covardia, entre
sentido e conveniência. O filme (que também deriva da literatura) trabalha a
pergunta-limite: É possível viver a vida sem sentimento?, que pode ser feita de
outra forma: É possível viver sem abrir mão do sentimento?
I will love again (Lara Fabian) – Caso clássico onde o repertório do amor romântico pode ser confundido com o repertório da obsessão
Serge Gainsbourg, Roberto Carlos e Julio Iglesias falam por
si mesmos
Na pintura, a fronteira entre o amor obsessivo e o amor
romântico perpassa toda a história, indo da pintura sacra à pintura “pós-contemporânea”.
Na escultura, um bom exemplo é a “maldita” Camille Claudel
Na poesia, podemos citar Byron e García Lorca
Gazela del amor desesperado - Lorca
La noche no quiere venir
para que tú no vengas
ni yo pueda ir.
Pero yo iré
aunque un sol de alacranes me coma la sien.
Pero tú vendrás
con la lengua quemada por la lluvia de sal.
El día no quiere venir
para que tú no vengas
ni yo pueda ir.
Pero yo iré
entregando a los sapos mi mordido clavel.
Pero tú vendrás
por las turbias cloacas de la oscuridad.
Ni la noche ni el día quieren venir
para que por ti muera
y tú mueras por mí.
Byron - A uma taça feita de um crânio humano - (tradução de Castro
Alves: Bahia, 15 de dezembro de 1869)
Não recues! De mim não foi-se o espírito…
Em mim verás – pobre caveira fria –
Único crânio que, ao invés dos vivos,
Só derrama alegria.
Vivi! amei! bebi qual tu: Na morte
Arrancaram da terra os ossos meus.
Não me insultes! empina-me!… que a larva
Tem beijos mais sombrios do que os teus.
Mais vale guardar o sumo da parreira
Do que ao verme do chão ser pasto vil;
– Taça – levar dos Deuses a bebida,
Que o pasto do réptil.
Que este vaso, onde o espírito brilhava,
Vá nos outros o espírito acender.
Ai! Quando um crânio já não tem mais cérebro
…Podeis de vinho o encher!
Bebe, enquanto inda é tempo! Uma outra raça,
Quando tu e os teus fordes nos fossos,
Pode do abraço te livrar da terra,
E ébria folgando profanar teus ossos.
E por que não? Se no correr da vida
Tanto mal, tanta dor ai repousa?
É bom fugindo à podridão do lado
Servir na morte enfim p’ra alguma coisa!…
Byron - Lines
Inscribed Upon A Cup Formed From A Skull
A abertura da vela solar está marcada para a madrugada desta quinta-feira, às 03h31 no horário de Brasília. Nesta ilustração é possível ver o corpo do NanoSail-D no centro da vela.[Imagem: NASA]
Não tenho bem certeza do que vai no coração de quem
gostamos,
Acendo, então, a primeira vela do bolo
Não tenho certeza de, se aos olhos de quem gosto, sou o que
espero ser
Acendo, então, outra vela
Não é certo que não estou sendo gravado,
Por isso, aceno mais uma vela e sorrio, mesmo sem estar
sendo filmado
Certeza não tenho, mas, mesmo assim, escuto a fé dos anjos
ascender mais uma vela para quem quero tanto bem
Não estou certo se o salto é alto ou elegante o bastante,
mas o que desejo para quem me é importante
É que o voo seja sonho o bastante...
E o sol, então, será mais uma vela acesa num bolo em forma
de planeta azul
Não tenho a mínima dúvida de quão incerto é saber se sou
querido como quero
Ou qual a fronteira entre o útil e o inútil, quando se trata
do carinho
Ou se me querem, diante de mim, e me desquerem atrás de mim
Não importa, pois a chama invisível do coração continua
ardendo
Mais do que todas a velas juntas, mais do que todas as
miríades juntas
E, diante disso, todo perfume e toda rosa e todos os
sentidos são um tatear cego e barato,
Talvez...
Não tenho certeza de se sou lúcido o suficiente
Ou louco na medida certa
Pois, pra mim acender uma vela para celebrar a vida desmedida
É mais importante que comprar uma régua com tecnologia Androide
Não tenho certeza se serei trocado ou preterido,
Ou pior: se serei aceito (e haja responsabilidade daí por
diante)
Mas, estar com o Nobre Alguém e presenciar o tempo se somar a seus dias:
Isso não há certeza que pague ou incerteza que apague.
Quando soprares esta poesia, faze um pedido
O meu, eu já fiz, em segredo: é continuar tendo a chance de te ouvir feliz e te ver feliz,
por trás da porta, que, dia sim dia não deixa a chave do lado de fora.
P.S.:A falta de certeza não é capaz de me impedir de gostar
e de amar o fato de tua vida existir
E meus poros eram uma narrativa em braile cuja dor cega
Os olhos d’água perdidos na atmosfera tentavam derramar
Curando a tristeza que alagava os desertos de mim
Havia tempos que não ia pro trabalho que não fosse vestido
de automóvel
Resolvera tomar um ônibus na Integração, eu e meu eu
fragmentado de saudade
Não conseguia ver nada, pois ondas de gentes se acumulavam
entre o começo e o fim: do ônibus
Foi quando começaram os gritos e mulheres choravam, fazendo
chover também do lado de dentro
“Eles estão armados”, gritavam!
A partir de então, fui sendo meio que esmagado, sentado na
cadeira que fica numa brechinha, lá na frente do ônibus.
As pessoas pediam que as portas do ônibus fossem abertas e imploravam
que permanecessem fechadas
Calmo estava, calmo fiquei. E pensei: vou morrer bem no dia
dos Namorados, antes de rever meu Nobre Alguém que não me pertence... Sem Aliança, sem Aikidô: só com um cansaço
dolorido que amornava em mim a fé.
Ainda ouvi as pancadas de tijolos sendo jogados contra as
paredes do ônibus.
Por um lado me senti até feliz, pois os habitantes daquele
lugar não se abandonaram uns aos outros. E ainda eram capazes de se indignar
com os insultos que os homens armados desferiam contra a honra alheia.
Graças a uma ligação para o 911, fomos salvos. Niguém saiu
ferido. Pela janela, vi um rapaz que, na contramão, andava com uma bicicleta
arranha-céu, daquelas de antigamente que tinham a roda da frente bem pequena e
a de trás bem grande (ou seria o contrário?): a esperança retornou e meus poros
foram tomados pela visão linda de um futuro luminoso.
Mas,não sabia que este futuro estava tão próximo. Quando
cheguei e vi o Nobre Alguém conversando com aquele garotinho (a beleza não se
contenta com pouco e trazia na mão dois pássaros voando...).
Quando o Alguém se permitiu ser visto por mim: meu Dia dos
Namorados estava ganho. E pensei: não namorava Alguém, mas Alguém era meu
namorado, visto que um dos sentidos deste termo é: “pessoa admirada,
encantadora e que exprime amor”.
Os sintomas eram claros: depois de rever Alguém, fiquei com
vontade de convidar o mundo inteiro para fazer o amor e deixei que alegria
ilimitada estacionasse em mim: enfeitada de nova oportunidade e de hora da
salvação: Eis a questão: mostrava-me Santo Antônio, depois que paguei, com a
alegria de ter revisto o Nobre Alguém, o seu resgate do cativeiro das
simpatias. E, demoraria um ano inteiro para ele (Santo Antônio) ser achado novamente...