29 de agosto de 2017

Bolsonaro também perseguirá os heteros


Chainless Photography via Visual Hunt / CC BY-SA



Uma parcela daqueles que se entendem como heterossexuais - ou, melhor dizendo, os heteronormativos - acham que estão livres da perseguição e do preconceito. Como se os gays sempre fossem os “outros”.

Nas rodas de conversas, os heteronormativos chamam a si mesmos pelo nome, mas apagam o nome dos homossexuais, que são reduzidos a uma categoria, sendo-lhes retirada individualidade.

O dilema da transexual Ivana, da novela A Força do Querer, ilustra essa tendência. Boa parte do sofrimento da jovem se deve ao fato de viver cercada por pessoas que, a fina força, querem fazer coincidir gênero e sexualidade, anulando as identidades complexas que se erguem nessa tensa fronteira.

A heteronormatividade comete o erro de achar que o fato de ser homossexual proíbe o ser humano de ser indivíduo dotado de particularidade e personalidade.  Daí, o entendimento de que todo homossexual que não se encaixa na forma de estereótipos é um enrustido ou um embusteiro.

Muitos têm se prostrado diante das ideias de Jair Bolsonaro, chorando nostalgicamente pelo retorno de uma era ideal – que nunca existiu – ondeseria possível distinguir, com exatidão, as fronteiras entre masculino e feminino, paralisando o complexo diálogo entre Yin e Yang.

Mas, a ideologia bolsonariana em sua busca pelo modelo ideal de homem vai produzir um efeito semelhante ao do conto O Alienista, de Machado de Assis, onde o personagem-título, de tanto enxergar loucura em todos que o cercam, acaba chegando â conclusão de que o único louco era ele mesmo.

A ideologia bolsonariana assim como rebaixa os homossexuais terminará criando subcategorias de heterossexuais, que também serão vítimas de discriminação.

Assim, poderão ser discriminados e tachados de enrustidos, por exemplo, os heterossexuais engomadinhos e perfumados; Ou talvez os heterossexuais que fazem da academia um templo de culto ao corpo.

Afinal, o ideal bolsonariano só chega ao orgasmo quando coloca todos sob suspeita. Ser homossexual assumido é, na visão à Bolsonaro, um crime. Porém, ter comportamentos que fazem a pessoa suspeita de não ser heterossexual é, no código penal bolsonariano, um crime qualificado e com motivação torpe.

Se, Deus nos livre, a ideologia bolsonariana triunfar, não vai adiantar sair por aí dizendo que come buceta para escapar da estigmatização. Isso porque, como nos lembra o canto traidor de Ossanha,  “aquele que diz sou não é”.

O Governo bolsonariano vai estabelecer uma hierarquia de castas de heterossexuais, conforme supostamente o heterossexual esteja ou não afastado do “vírus” da homossexualidade.

E, no fim, talvez Bolsonaro descubra que até mesmo ele é um heterossexual sob suspeita.

25 de agosto de 2017

O (trans)tornado e suas calmarias


Foto: Karla Vidal


Todos os dias, sou apresentado a um desconhecido
A quem amo amar
Nele posso ancorar meus naufrágios

Vela e farol se tornam desnecessários
Porque sinto que minha luz está reaprendendo a se acender

Prefiro beijar a falar da vida alheia
E pós-firo segredar a segregar

Quem quiser dormir abraçado comigo
Não pode ter intolerância a liberdade

Depois que atravessei clandestinamente
A fronteira de mim mesmo
Perdi a vergonha
De ser fiel ao eu que me tornei

Quero te emprestar um pouco
Desse tornado doce
Mas, a prioridade
É me dar a mim mesmo

As pessoas acham tanta coisa a desrespeito dos outros
E vivem tão perdidas

Um abraço de portas abertas
E estreitos ensolarados
É melhor que qualquer achismo

Invada-me, como um cavalheiro,

E me prove que há ciência na astrologia

13 de agosto de 2017

O que Papa Francisco deve fazer a respeito do desfile de tochas neofascista


umbertodpc via VisualHunt.com / CC BY-NC-ND


Uma funcionária pública me pediu que orasse pelo filho dela
Eu disse que ia pedir que minha mãe orasse, mas ela insistiu em
Meu coração bom [o ônus da prova cabe ao acusador]

Mas, mal sabia ela que, na hora de orar, eu pedia
Que Deus fosse rápido em ouvir minha prece
Que, ultimamente, sempre só consegue morar de passagem por meu coração absurdo

Às vezes, pareço uma caberna onde a inteligência é substituída pelo eco de trocadilhos
Um louco motiva meus trilhos a não desistirem de fazer os trens tremerem
E visita uma oca onde o Aikido não se contente em regredir à faixa preta a cada nova aula

Outro dia, um amigo me perguntou se a ruindade de fulana era por ela ser lésbica ou algo do tipo
E percebi que para ser “bom”, era necessário ser hetero, casado, rico e se deixar controlar por
Um macho, independentemente de ele ser homem ou mulher ou, até eu mesmo

De repente, esta poesia foi interrompida por uma tocha
Lançada de outra dimensão por um neofascista

E por que pra ser contrário à imigração,
Preciso destruir os judeus?

Não se é contra os negros e os gays
Se é contra uma paisagem onde a alternativa não seja mais subjugada
Onde o fazer alheio seja não o cumprir a ordem, nem o ufanar-se do progresso

Entre dois gays, onde fica o lugar da mulher subjugada?, indaga um furioso neofascista
Como estarei no controle, num mundo onde meu chicote não é páreo para a lei áurea?,
Questionou um futuro candidato à presidência da Ilha de Vera Cruz

E ele mesmo responde, sem tirar as mãos do Bolsonaro:
Meu lugar no mundo é à sombra de alguém fulminado por um ataque terrorista
Minhas dez mil virgens, minha água fresca, meu paraíso
Brota numa taça amarga

Taça de sangue feito de uvas selecionadas,
Uvas que não se encaixam na ditadura da natureza,
Cuja bula foi prescrita não por “Eu Sou”, mas por “Seja como eu”
À luz do tenebroso lançar de dados de Lord Armadilha e de um Loukin-Jong

Papa Francisco eu te ordeno que, pelo amor do Amor, não desligues as fontes do Vaticano
Onde encontraremos água pra lavar os corações rochosos que se escondem por trás das tochas?
Onde as moedas mergulharão para realizar meus desejos egoístas?

Eu te ordeno que, pela gentileza do Galileu, canonizes Galilei

Pra que haja tempo ainda de meu coração se apaixonar nova e reciprocamente
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