Pintura de Gil Vicente |
O escritor Henry Thomas afirma que Chopin era uma criança
aluada, pálida e sentimental. É bem provável que, se ele tivesse conhecido César
Leal, quisesse “tomar posse” dos seus “claros copos de lua” e tomar uma taça de
queda d’água na companhia de Scarlet Moon (certamente haveria o risco de Dr.
Roni aparecer e dar um faniquito, mas ça
va!).
A poesia que meio que torna íntimas pessoas que nos são estranhos
desconhecidos. Se bem que onde os “corpos de fogo” se escondem, o conhecimento
é um mero detalhe.
No sonho de César Leal, violinos cegos tocam uma melodia que
fica a cargo do leitor da poesia inventar. Chopin ensinou o piano a ser cego
para que da música se abrisse a terceira visão.
Como diria a amiga Iara , o hipertexto nos lança em
redes de conexões que nos permitem descobrir novos mundos (a melhor tradução para "pessoas") sem precisarmos ser
Cristovãos Colombos. É como se o hiperlink, nesse caso, tivesse o poder de
mudar o hiperacaso em hiperdestino. César Leal elogiou o sonho, o ancestral
mais ilustre do hipertexto, esse misterioso ser cuja identidade transita entre “furacão voante” e “vale secreto”.
Com as palavras,
analisou a sombra e, inspirado pelos cortejos de maracatus recifenses, fez a
poesia soar o “tambor cósmico”. E, não estranharia eu se, deste tambor, uma
fenda (um buraco negro?) convidasse os noturnos de Chopin a brotarem,
ajudando-nos a encontrar la tendresse
que la tristesse cache.
Elogio do sonho
Quando caminha nas águas
banha as agulhas noturnas
e bebe chamas de espumas
nos claros copos da lua
esconde no corpo um fogo
claro, vermelho, constante:
rubro ondular de bandeiras
por entre nuvens dançantes
ei-la subindo nas chuvas
galopando em seu cavalo
a cabeleira de trigo
solta ao furacão voante
ordena para que um dia
os sons se mudem nas cordas
destes violinos cegos
que por entre urtigas tocam
— vejo-a inteira, emparedada
entre as brasas que caíam
naqueles vales secretos
onde as árvores fugiam.
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