Alan Turing Fonte da imagem: Transcultural Buddhism |
Alan Turing estaria completando cem anos. Ele é considerado
um dos pioneiros da automatização da lógica binária (formada por zeros e uns),
isto é, da computação. E foi vítima de
um tipo de preconceito herdeiro dessa mesma lógica binária que, por sua vez, é
herdeira de uma apropriação extremista do Cartesianismo, o qual pressupõe a
verdade do mundo como a divisão entre o Sim e o Não sem tolerância aos nuances
intermediários da ambivalência.
O cientista foi, a exemplo de Oscar Wilde e Verlaine, processado criminalmente por conta de sua
homossexualidade, considerada ilegal na Inglaterra dos anos de 1950.
Turing foi
publicamente humilhado, sendo impedido de dar continuidade a seu trabalho como
pesquisador. Ele foi também submetido a uma castração química. Recebeu altas
dosagens de hormônio feminino, o que o fez adquirir seios. Dedicou parte de sua vida ao auxílio de
operações militares de espionagem, mas não teve direito à preservação da esfera
privada de sua vida.
A castração química parece, hoje, um fantasma absurdo
perdido na poeira do tempo. Porém, não se deve perder de vista a ameaça de um
outro tipo de castração: a castração simbólica. Este tipo de castração não
trabalha com hormônios, mas sim com atitudes que, igualmente, procuram inibir a
energia vital e fazer nascer no indivíduo algum tipo de estigma silencioso que
o impeça de, convivendo com os demais, manter sua vida produtiva.
A castração simbólica não opera com hormônios, mas, assim
como estes, age de forma velada, por meio de gestos mudos produzidos pelas
glândulas do desprezo, da intolerância e da própria tolerância: uma maneira de
restringir a liberdade de ir e vir a guetos escriturados no cartório da “boa
conduta”.
São João é fruto de uma ação divina que venceu a dupla
castração da qual seus pais foram vítimas. João Batista era filho de Santa
Isabel, uma mulher de idade avançada e, até então, considerada estéril.
Nesse período, uma mulher estéril estava, em certa medida,
predestinada. Era considerada como uma pessoa amaldiçoada e socialmente inútil –
por ser incapaz de gerar descendentes. Além disso, por não ter filhos, estaria
potencialmente sujeita a uma viuvez solitária revestida do abandono e da
miséria. Mas, a esterilidade de Isabel foi revertida e ela conseguiu desconcertar a soberba de uma sociedade acostumada a fazer da castração sinônimo de lógica e de destino.
Parte do potencial intelectual e vital de Turing foi desperdiçado
com sua morte prematura aos 42 anos, após ter supostamente se suicidado,
comendo metade de uma maçã na qual havia sido injetado cianeto. Em certa
medida, a sociedade se comportou como uma terrível madrasta que lhe ofereceu a
maçã envenenada e o medo de ter no outro um espelho.
Em 10 de setembro de 2009, após uma campanha na internet, o primeiro-ministro britânico
Gordon Brown pediu, oficialmente, desculpas públicas, em nome do governo
britânico, devido à maneira pela qual Turing foi tratado após a guerra.
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