Foto: Mônica Imbuzeiro - Agência O Globo |
Deus escolheu a terça-feira para que a sanfona chorasse em
silêncio a partida de Dominguinhos
A música do Plantão da Globo não combinaria com o toque de
sanfona do filho de Garanhuns
Certo é que tá difícil de aparecer um baixo de acordeão à
altura do fole desse senhor,
Que assim como sua cidade natal desafiava as imagens
estereotipadas do sertão
Trazia no toque o pungente lamento sertanejo, mas também a
musicalidade clássica evocada pela elegância do inverno
“Vozes veladas, veludosas vozes”, recitou Yamandú Costa em
memória de Cruz e Souza,
Que teve saudade do futuro e escreveu suas sinestesias numa
homenagem a Dominguinhos, Avant la lettre
E muitas pessoas julgando o Papa Francisco por abrir mão das
prerrogativas de pontífice
Quantas vezes Dominguinhos também não abriu mão de sua
parcela Mozart
Para chocar os preconceituosos absurdos , que, atordoados,
O escutaram extraindo rosas clássicas do Pé de Serra?
E um nefelibata recusou-se a apresentar-se, hoje, no Cirque
du Soleil
Ficou complicado sentir saudade de caminhar no Céu sem a
certeza,
Dada pela música desse sanfoneiro,
De que, após a apresentação,
Seria possível voltar pro Aconchego
Quem dera fosse engano a morte de Dominguinhos
Como foi alarme falso a morte de Mandela
Que a música secreta do coração do sanfoneiro
Possa trazer alívio para as crianças que perderam seus pais
Na BR 101, vítima dos buracos
Presentes nos “corações” dos dirigentes públicos
Que empurram uns para os outros a responsabilidade
De fazer recapeamentos nojentos
Enquanto famílias enterram vidas desperdiçadas
Que são choradas: não por sanfonas, mas por órfãos
Tomara que quando Dominguinhos esbarrar em Chiquinha Gonzaga
A Lua Branca se torne uma Juke Box. Melhor dizendo,
Que a lua se torne um disco de Platina infinítupla
E se dê para o discípulo de Luiz Gonzaga:
E, assim que Dominguinhos voltar a tocar
A Lua perceberá que Dominguinhos foi o prêmio, a consolação,
E ela (e nós), a agraciada (os agraciados)
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