23 de agosto de 2012

Jornalismo e o ato de fingir a verdade

La valse -  CAMILLE CLAUDEL





Como diria Albert Camus, citado por Boris, meu professor d"Aliance Française, citado por mim, é possível almejar a verdade e, mesmo assim, ter opinião.

Realmente, é possível ter opinião, desde que se tenha, de algum modo, a atenção dos outros. Alguma verdade nascerá das terras cultivadas pela atenção, por mais impenetrável que pareça o véu da mentira.

A exemplo de todo sentimento que parece existir por si só, a verdade, recitando Nietzsche, é um pacto, um contrato entre partes e, como tal, pode ser forjado segundo diferentes parâmetros.

Certamente talvez, o mais comum dos pactos da verdade é criado quando se oferece em sacrifício o silêncio de alguém ou alguéns  nos altares da conveniência, mais conhecida como unanimidade.

A verdade anda meio tímida, pois, nos tempos de agora, atenção e opinião são especiarias plantadas não no solo das Índias, mas sim no Cabo das Tormentas.

Prestar atenção dói porque quem presta atenção pode achar que está depositando a própria alma nas mãos de um agiota que executa a dívida antes de emprestar o dinheiro.

As pessoas discutem a verdade do jornalismo com base no tempo. A TV é mais veloz na produção da notícia e, por isso, seria menos rigorosa na apuração e, consequentemente, mais falsa. Se esse critério fosse verdade, a maior fonte de verdade seriam as obras de arte, que, tantas vezes, gastam anos de profunda reflexão para tazer sua verdade à luz do dia.  Se esse critério fosse verdade, uma valsa bem dançada seria mais verdadeira que qualquer texto jornalístico.

O texto jornalístico é um fingimento, na falta e no excesso. Quando o jornalista tem pouco tempo e pouco espaço, sua mentira (Ops, sua matéria!) aparece como tentativa de administrar a pressão e a asfixia. Quando o jornalista tem tempo e espaço de sobra, seu texto se torna uma tentativa de reerguer a República de Platão, mundo daqueles que, por meio da mente, tentam governar o mundo, fazendo dele reflexo de ideais imutáveis.

Se o jornalismo bebe do mundo das ideias imutáveis (incluindo a ideia de que vivemos num mundo inevitavelmente ferido por valores descartáveis e pela indiferença fútil) e ignora as sombras que habitam o fundo da caverna da opinião (pública ou privada), a verdade dos “fatos” não passa de de uma descarga de comodismo e neurose, embalados à vácuo pela precipitação e pela burrice.

Como dirá Habermas, o mais próximo da verdade que se pode chegar é plantar o diálogo sincero, procurando aliar opinião e atenção. E sinceridade aqui não se trata de uma fórmula piegas. Trata-se do esforço de perceber a luz das sombras escondidas em baixo do trono das falsas verdades que, tingidas de claridade oca, insistem em ser, ao mesmo tempo, únicas e plenas.

2 comentários:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...