Super-Homem - Por Arian Noveir |
A Anuska Vaz, que me apresentou o texto de Miguel Rios
As narrativas de super-herói - a exemplo do filme Os Vingadores, inspirado nos quadrinhos
homônimos publicados pela Marvel Comics - têm sido interpretadas como um tipo
de botão que se aperta para, durante algumas horas, desligar a realidade e
fugir do enfado e do desencanto.
Este ponto de vista faz sentido, mas prefiro pensar que o
super-herói, mais especificamente em seu formato contemporâneo, é como um
espelho no qual a realidade trava um confronto com seu avesso: o ideal. Diante
desta relação especular, a audiência experimenta não tanto o alívio da catarse,
mas sim o desconforto de perceber que nem o realismo nem o idealismo são
refúgios seguros.
O idealismo que, ao buscar seu reflexo, depara-se com a
realidade (e vice-versa) conhece seu lado mais terrível. Se, em sua origem naif, os super-heróis representavam o anseio
luminoso pela liberdade, em seu formato recente enfatizam o conflito entre a
luz e as sombras deste ideal.
Os super-poderes não vêm desacompanhados de efeitos
colaterais. O personagem Arcanjo, dos X-men,
por exemplo, pode cortar os oceanos aéreos com suas asas, mas seu voo não pode
afastá-lo da reprovação e do horror que os seres humanos ditos normais sentem
perante o que consideram uma anomalia genética. Neste caso, dom e maldição se
tornam duas faces de um mesmo espelho.
E assim ocorre com tatos outros personagens. O dom de
Vampira de, ao toque, roubar memórias e poderes dos outros, poderia ser
encarado como o sonho mais secreto de se apropriar das habilidades alheias.
Porém, termina sendo a maldição de uma pessoa que não consegue oferecer nenhum
carinho livre do sopro gelado da morte e que não pode ser tocada sem ser
invadida pela alma alheia, colocando em risco de extinção sua própria psique.
Não creio que as pessoas sentadas diante de um filme de
super-heróis busquem somente dar vazão à liberdade. Procuram também conhecer os
terríveis fantasmas que moram no sótão de seus ideais.
Mas, existe outro lado dessa questão. Exemplo é o Capitão
América, que coroa sua grandiosidade épica não nos músculos ou no nacionalismo
norte-americano, mas sim na memória recorrente de sua origem: um homem que, a
despeito da debilidade física, não hesita em se sacrificar para proteger os
outros. Neste caso, a miséria se olha no espelho e recebe de volta a imagem não
da força imbatível e subjugadora, mas sim da força que se empresta aos mais
fracos para lhes abrir a oportunidade de expressar a força ocultada pelas
violências e pelos preconceitos.
Não se trata de um personagem que simplesmente projeta a
ambição da audiência de corrigir os desacertos do mundo com a força física ou
mental. Contrariamente, o Capitão América – bem como os X-men - mostram como dos desacertos pode germinar a potência e como
a aparente onipotência pode ser uma passagem secreta para terríveis distorções
do caráter humano.
Um texto instigante não almeja à carreira diplomática ou a
uma vaga no Congresso Nacional. Em outros termos, abre mão de qualquer
prerrogativa de imunidade e, antes de subentendidos, abriga em suas entrelinhas
um convite a ser contradito. É o caso do
artigo que inspirou esta postagem: Superorgulho de amar super-heróis, escrito
recentemente por Miguel Rios.
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