8 de maio de 2012

Os Super-heróis e o espelho em que realismo e idealismo promovem um ajuste de contas


Super-Homem - Por Arian Noveir





 A Anuska Vaz, que me apresentou o texto de Miguel Rios



As narrativas de super-herói - a exemplo do filme Os Vingadores, inspirado nos quadrinhos homônimos publicados pela Marvel Comics - têm sido interpretadas como um tipo de botão que se aperta para, durante algumas horas, desligar a realidade e fugir do enfado e do desencanto.

Este ponto de vista faz sentido, mas prefiro pensar que o super-herói, mais especificamente em seu formato contemporâneo, é como um espelho no qual a realidade trava um confronto com seu avesso: o ideal. Diante desta relação especular, a audiência experimenta não tanto o alívio da catarse, mas sim o desconforto de perceber que nem o realismo nem o idealismo são refúgios seguros.

O idealismo que, ao buscar seu reflexo, depara-se com a realidade (e vice-versa) conhece seu lado mais terrível. Se, em sua origem naif, os super-heróis representavam o anseio luminoso pela liberdade, em seu formato recente enfatizam o conflito entre a luz e as sombras deste ideal.

Os super-poderes não vêm desacompanhados de efeitos colaterais. O personagem Arcanjo, dos X-men, por exemplo, pode cortar os oceanos aéreos com suas asas, mas seu voo não pode afastá-lo da reprovação e do horror que os seres humanos ditos normais sentem perante o que consideram uma anomalia genética. Neste caso, dom e maldição se tornam duas faces de um mesmo espelho.

E assim ocorre com tatos outros personagens. O dom de Vampira de, ao toque, roubar memórias e poderes dos outros, poderia ser encarado como o sonho mais secreto de se apropriar das habilidades alheias. Porém, termina sendo a maldição de uma pessoa que não consegue oferecer nenhum carinho livre do sopro gelado da morte e que não pode ser tocada sem ser invadida pela alma alheia, colocando em risco de extinção sua própria psique.

Não creio que as pessoas sentadas diante de um filme de super-heróis busquem somente dar vazão à liberdade. Procuram também conhecer os terríveis fantasmas que moram no sótão de seus ideais.

Mas, existe outro lado dessa questão. Exemplo é o Capitão América, que coroa sua grandiosidade épica não nos músculos ou no nacionalismo norte-americano, mas sim na memória recorrente de sua origem: um homem que, a despeito da debilidade física, não hesita em se sacrificar para proteger os outros. Neste caso, a miséria se olha no espelho e recebe de volta a imagem não da força imbatível e subjugadora, mas sim da força que se empresta aos mais fracos para lhes abrir a oportunidade de expressar a força ocultada pelas violências e pelos preconceitos.

Não se trata de um personagem que simplesmente projeta a ambição da audiência de corrigir os desacertos do mundo com a força física ou mental. Contrariamente, o Capitão América – bem como os X-men - mostram como dos desacertos pode germinar a potência e como a aparente onipotência pode ser uma passagem secreta para terríveis distorções do caráter humano.

Um texto instigante não almeja à carreira diplomática ou a uma vaga no Congresso Nacional. Em outros termos, abre mão de qualquer prerrogativa de imunidade e, antes de subentendidos, abriga em suas entrelinhas um convite a ser contradito.  É o caso do artigo que inspirou esta postagem: Superorgulho de amar super-heróis, escrito recentemente por Miguel Rios.

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