18 de abril de 2014

A cruz que espera um abraço

Cruz

Pensei se a cruz não seria
Um repositório de correspondências devolvidas
Ou, talvez, de sonhos selados
Galopes que tentam inutilmente galgar o impiedoso horizonte
A cruz, talvez, seja feita de madeira de Lei,
Mas está de braços abertos, com seu coração chagado
Chovendo sobre um rio de cartas às quais o mundo endereçou o anonimato
A cruz é feita, certamente, de portas na cara
Do rir que preferiu ser rir do outro do que rir com o outro
Disseram-me que poderia colocar aos pés da cruz tudo
Dores, odores, súpuras e até meus piores crimes, como a bendita coca-cola
Minhas piadas sem graça, e as desgraçadas também
Posso colocar até o que me foi roubado aos pés da cruz
Para que ela tenha o que calçar quando, no meio da noite,
Precisar se levantar para matar sua sede de tropeços
E também minhas ironias de ronin desengonçado
Minhas orações de cor de criança
Que nem sabia teu nome, mas já assobiava tua consolação
Trago aos pés da cruz as linhas apagadas, cheias de dívida
E de dúvida se devo
Ou se espero me adaptar às expectativas sádicas da oposição
E choro quando vejo Teu lábio ferido por uma esponja embebida em Maquiavel
Mas, a ressurreição me prova que existe quando te reencontro por acaso no shopping Recife
E me pergunto quando a ressurreição fará desmoronar a cruz
E quando as pessoas perceberão que o único motivo de a cruz permanecer de braços abertos

É que lhe falta um abraço apertado. 

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