9 de outubro de 2013

A revanche de Perséfone e o futuro da mídia diante da crise econômica da fofoca



Lazarsfeld, considerado um dos pais das teorias da Comunicação, afirmou que um dos principais pilares do circuito comunicacional é a fofoca.  Sem ela, o alcance do que é veiculado pela mídia seria nulo. Fofoca, bisbilhotagem: a eficiência dos meios de comunicação estaria diretamente ligada à capacidade destes de exercerem sua vocação de janelas indiscretas.

Neste sentido, as revistas de Celebridades são espaços consagrados à fofoca sobre a programação da TV, retroalimentando este meio de comunicação.  Isso já era verdade nos primórdios do jornalismo, quando a fofoca semeada nos Cafés era combustível que fazia continuar trabalhando a prensa na qual eram gestados os jornais.

Hodiernamente,  certamente talvez sejam as redes sociais o principal celeiro de fofoca do qual se nutrem as mídias. E, nos murais e mensagens privadas do Facebook, no Twitter, no Instagram, a fofoca enfrenta o desafio de se adequar a normas de uma etiqueta que acreditamos ser nata sem perceber que é, a todo instante, reinventada.

E, os requintes, ora de crueldade, ora de generosidade (momento raro), da fofoca experimentam a pressão imposta pelas característica peculiaridades das diferentes redes sociais.

O problema é que a mídia vem sabotando sua própria inspiração: o boato: fundado na maledicência. Pensemos no fenômeno Sérgio Reis, com sua “Panela Velha” (anos 70?). Qual  foi a matéria-prima deste sucesso senão ter enfrentado a dose de maledicência presente no preconceito de que uma mulher, ao cruzar o cabo Honoré de Balza, estaria velha e condenada a não ser mais desejada por um homem. O que esta canção fez foi desdenhar do preconceito que nutriu durante tanto tempo as "conversas de bastidores" (fofocas).

A sabotagem da fofoca vem se intensificando diante da pluralidade de padrões estéticos e culturais que está ganhando espaço na mídia. Nas timelines e, na própria TV, as madeixas pixaim conquistam reconhecimento equivalente ao dos cabelos lisos (antigamente chamados de “bons”), índios, orientais, negros e caucasianos trabalham juntos na mesma equipe de revezamento em busca do reconhecimento. E mulheres de quarenta anos acham terreno para ostentar uma beleza que nada deve a de duas mulheres de vinte.

Perséfone entra linda na igreja (Foto: Pedro Curi / TV Globo)
Na novela das 9, de Walcir Carrasco, o caso da personagem Perséfone desafia o preconceito de que é impossível a uma pessoa gorda ser amada por alguém magro. Assim, rouba das línguas ferinas o "privilégio" de,  mesmo sem falar, fofocarem através das mal traçadas linhas do Face e dos mal traçados caracteres do Twitter.  De certa forma, a redenção da Perséfone da novela contribui para redimir a figura mitológica de mesmo nome. Na mitologia grega, Perséfone, filha da deusa Ceres, foi condenada a ser uma eterna transeunte, passando seis meses na Terra e seis meses no Inferno. Na novela, a personagem ganha o direito de revanche, expondo, questionando e neutralizando preconceitos que a covardia nutre por meio da fofoca: versão contemporânea do vai-vem entre a vida e a morte (dos corpos e das almas) ao qual estão sujeitos suas vítimas

Num contexto em que as fronteiras dos valores buscam frequentemente se reconfigurar, a fofoca vive um momento delicado, pois ela costuma precisar de certezas, mesmo que sejam certezas falsas, para se manter de pé.

Ao lidar com a fragilidade de suas opiniões preconcebidas, os meios de comunicação inibem a fofoca e, com isso, precisam repensar qual será seu combustível. Talvez, a partir de agora, Perséfone tenha a chance de ficar mais tempo livre do vai-vem entre Terra e Inferno, cuja versão contemporânea é o ciclo do disse-me-disse.




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