3 de agosto de 2011

Reflexões sobre o Supercon - Parte 2 - Os super-heróis são menos sobrenaturais do que parecem

Shazam por Alex Ross

Os super-heróis são menos sobrenaturais do que parecem. Pelo menos alguns deles, a exemplo de Shazam, anteriormente conhecido como Capitão Marvel. Esta é uma das ideias defendidas pelo pesquisador gaúcho Iuri Andréas Reblin, um dos organizadores do livro Super-heróis, cultura e sociedade. 

Segundo Reblin, a marca de Shazam é seu flerte com a magia e não com o caráter místico. Enquanto o místico liga-se a segredos que a espiritualidade tranca a sete chaves nos porões do cosmos, a magia atua na direção oposta. Ela abre portas, criando canais de comunicação entre transcendente e imanente.

Porém, estas portas não são governadas pelo bel prazer do mago. O que a magia faz é permitir que uma centelha do divino se aloje na precária morada da “realidade”. Shazam ou o Capitão Marvel é um dos veículos desta centelha. Reblin explica que o personagem, em certo sentido, é menos mágico que um mago. Enquanto feiticeiros podem reverter o encanto sem aviso prévio, a Shazam não é dado este benefício. Ele pode ligar o interruptor da centelha divina, mas não pode desligá-lo quando quer.

Vale a pena lembrar que a troca de nome deste personagem não está relacionada ao crime de falsidade ideológica ou a recomendações da Numerologia. É fruto de uma disputa judicial na qual o personagem da editora americana DC (Detective Comics) perdeu o direito de uso sobre o nome Capitão Marvel, por este ser o nome da sua maior rival: a editora Marvel Comics.

Se Shazam representa uma injeção de transcendência no plano da realidade, a personagem The Pro representa uma injeção de realidade no plano da transcendência.

The Pro é o título de uma revista, escrita por Garth Ennis e publicada em 2002, nos Estados Unidos, pela editora Image. Conta a história da personagem conhecida por The Pro: uma prostituta que ganha super-poderes de um ser chamado The Viewer: um misto de divindade e de voyeur pervertido.

Shazam traz em si além de seu nome o nome das seis divindades que evoca para sua transformação. Já The Pro vive sua curta existência, de apenas uma revista, sem se saber qual é o seu nome.

Como observa a pesquisadora de The Pro, Luciana Zamprogne Chagas, da Universidade Federal do Espírito Santo, esta personagem rompe o pacote de perfeição hermeticamente fechado que envolve o mito dos super-heróis. Confirmando a necessidade feminina de ter múltiplas jornadas de trabalho, The Pro tenta conciliar a vida como mãe solteira de um recém-nascido, super-heroína e profissional do sexo.

The Pro é um elemento desviante no sistema moral dos super-heróis tradicionais. Ela pertence  à Liga da Honra (The League of Honor), um grupo formado por personagens que são paródias dos super-heróis clássicos, a exemplo de The Saint, uma paródia do Super-Homem e The Lady, uma paródia da Mulher-Maravilha. 

Hostilizada por seus hábitos marginais, The Pro não deixa de representar a tentativa de estabelecer um canal entre o mundo real e o mundo idealizado. Mas este duto, revestido de ironia, joga na cara do idealismo suas ilusões e contradições. Por isso, como afirma Luciana Zamprogne, The Pro, toda vez que tem sua conduta julgada pelos seus companheiros super-heróis supostamente perfeitos, responde com algo do tipo: É fácil ser perfeito quando não tem de se lutar pela sobrevivência.

Conheça mais sobre as pesquisas de Iuri Reblin, visitando o blog Teologia e Arte sequencial.

Confira notícias, pesquisas e curiosidades sobre o universo dos quadrinhos no blog GibiHQ, da pesquisadora Luciana Zamprogne.

Na próxima postagem, vamos falar sobre os cosplays, que dão vida à alma do Supercon e do Encontro Nacional de Quadrinhos.

Não deixe de ler também: Os super-heróis e o espelho em que realismo e idealismo promovem um ajuste de contas.

2 comentários:

  1. Ei, será que são mesmo menos sobrenaturais do que aparentam? Se a magia cria canais entre o imanente e o transcendente, em que medida não seria ela uma espécie de mística? Será que magia e misticismo (ou mito e religião) não se confundem nas narrativas das histórias de Shazam? :-) No mais, valeu pela resenha e pelo feedback da Super-con! Abs!

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  2. Oi, Reblin! Como vai essa (super)força? Ao dizer que os super-heróis são menos sobrenaturais do que parecem referia-me ao fato de serem representações da abertura de canais de comunicação entre o imanente e o transcendente. Nesse sentido, seriam menos místicos do que mágicos. Mas isso, se o ponto de partida é uma distinção entre místico (esfera dos segredos cósmicos) e mágica (relação dialética entre o místico e a práxis.

    Porém, como bem destacaste, magia e misticismo estáo incontornavelmente ligados, visto a magia ser a abertura das comportas da mística, fazendo-a desaguar na "realidade". Neste sentido, a religião e outras expressões do imaginário são canais da comunicação mística/mágica.

    Fiquei muito feliz com teu comentário. Obrigado e um grande abraço!

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