1 de agosto de 2011

Reflexões sobre o Supercon - Parte 1 Wolverine, Dorian Gray e Death note: unidos pelo vício da liberdade

Uma das ideias-base da teoria do super-herói desenvolvida pelo pesquisador Edmilson Marques, da Universidade Federal de Goiás, é a de que os super-seres seriam expressões do desejo reprimido por liberdade.  Neste sentido, a identidade secreta seria representação do ser humano alienado, preso à condição de instrumento do modo de produção capitalista. 

Mesmo sendo tentado a me render diante desta ideia e me admirando com a capacidade que o pensamento marxista tem de expandir suas fronteiras agrícolas, não posso concordar com ela integralmente. 

A liberdade usufruída pelos super-heróis não deixa de ser, lembrando Sartre, uma condenação. Eles são livres enquanto encarnações da possibilidade ilimitada, mas são reféns do chamado incontornável a sacrificarem sua vida pessoal em prol da salvação coletiva. Neste sentido, troca-se a alienação representada pela identidade secreta pela alienação de estarem submissos à ânsia da humanidade por salvação.

Então, como pode haver escravidão maior do que ter como patrão a humanidade oprimida e sedenta por redenção?

cena do filme Dorian Gray, de Oliver Park
Podemos também pensar na liberdade ilimitada como sendo um vício. Ótimo exemplo disso é Dorian Gray, de Oscar Wilde.Nele, a perda da sensação de limite é diretamente proporcional à perda da capacidade de ter empatia, isto é, de comungar dos sentimentos dos outros. 

O resultado é um tédio existencial para o qual Dorian Grey só acha paliativo no instinto de destruição. Neste caso, a identidade secreta em vez de ser deixada para trás, torna-se a podridão do sepulcro, que o véu de cal das aparências tenta encobrir. 

É interessante notar que, no campo ficcional, Dorian Gray é precursor de Wolverine, pois ambos são feridos pelo poder do fator de cura. Mas há uma diferença crucial entre eles. 

Grey é a prova viva de que não há esquecimento capaz de apagar os rastros de nossas ações no mundo. Logan, contrariamente, é o atestado de que não podemos nos fiar no testemunho de nossa memória, sujeita às intempéries da ilusão, tanto a ilusão alimentada pelas outras pessoas, quanto pelos fantasmas do eu.

Em Wolverine, descobre-se que o caminho da liberdade ilimitada é o mesmo caminho da solidão e do desterro. O drama de Wolverine é sofrer os danos de um vício, sem ter tido a chance de recusar a primeira tragada.  Wolverine é condenado a ser livre porque é condenado a não ser capaz de criar vínculos estáveis seja com o tempo, com o espaço, com a memória ou com os demais seres humanos

Light Yagami - personagem principal do anime japonês Death Note, escrito por Tsugumi Ōba  – também é um viciado em liberdade. Porém, de forma diferente da de Dorian Grey. 

Yagami ao obter a “agenda da morte”, adquire o poder de, por meio da palavra escrita, decretar a morte das pessoas. Converte em arma letal o próprio nome de suas vítimas. Em posse desta arma, Light tenta eliminar todos os criminosos e criar um mundo onde não exista o mal.

Como observa o pesquisador Genis Frederico Schmaltz, da Universidade Federal de Goiás, este "ideal" reflete a incapacidade do personagem de sair de um círculo vicioso, constituído pelos elementos de insatisfação, desejo e glória. O componente “desejo” fica encurralado entre a eterna insatisfação e a brevidade da glória adquirida nas “vitórias” de Yagami.  Preso neste círculo de eterno retorno, o personagem faz da liberdade uma droga, sem perceber a dependência químico-espiritual que o aflige.

Confira as reflexões de Genis Frederico Schmaltz sobre Death Note.

Esta é a primeira de uma série de postagens dedicada a explorar o universo do Supercon e do Encontro Nacional de Quadrinhos, ocorridos nos últimos três dias de julho de 2011.

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