Imagem do clipe Só dá Tu - banda A Favorita |
Se me perguntassem qual a música do ano, a favorita, responderia
sem titubear: Só dá tu, imortalizada na voz de Rafaela Santos.
A canção consegue devolver ao pronome Tu o lugar no pódio
que, há tempos, vinha sendo ocupado pelo pronome você.
A norma culta não permite o sabor de dizer Eu amo tu, porque
Tu não pode ser utilizado na função de objeto, estando sujeito a ser sempre
sujeito.
Mas, em Só dá tu, o tu, no auge de sua normatividade, é
inquestionavelmente sujeito, mas uma espécie de inconsciente linguístico
confere a ele (ao Tu) um sabor de transgressão como ocorreria se a Constituição
permitisse dizer Eu amo tu.
Os integrantes do Movimento Sou Cultural, talvez não tenham
notado que Só dá Tu significa um salto quântico dado pelo Arrocha, um dos
afluentes do tecno-brega, em direção ao refinamento.
A letra permite a quem canta exprimir com cores de infância
a obsessão dos românticos malditos do século XIX. O Byron que habita os versos de Só dá Tu
prefere rir de si mesmo. Assim, o peso da obsessão se dilui nas ondas que o
ritmo da música sugere.
Dick Farney, que imortalizou Alguém como Tu, se tivesse se
lançado como cantor nos dias de hoje, não pensaria duas vezes: dividiria o
palco com Rafaela Santos.
O pronome tu e a língua portuguesa agradecem por esta grande
invenção sonora, que cinge o fado com a cadência da loa africana e os bits da
música pop.
Quem prestar atenção direitinho vai encontrar em Só dá tu
vestígios arqueológicos do blues, com suas síncopes costuradas por ondas, que
fazem o corpo imitar o mar e, de contratempos em contratempos, ter aquela
sensação de quem, prestes a adormecer, acorda-se assustado como se fora cair no
abismo.
Algo, na composição de Elvis Pires, remete à ingenuidade das primeiras composições românticas de Elvis Presley.
Algo, na composição de Elvis Pires, remete à ingenuidade das primeiras composições românticas de Elvis Presley.
Eu não teria vergonha de cantar no teu calcanhar do ouvido, anjo e/ou leão, o
refrão Só dá tu.
Obs.: esse texto não busca ser irônico.
Obs.: esse texto não busca ser irônico.
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