Fonte da imagem: Info Taekwondo |
A "temível" pré-faixa preta...
Porque a véspera é tensa pra quem tem medo de ressuscitar
Ter de sair do sepulcro e ver o olhar assombrado dos que
não estão acostumados
A conviver com ex: ex-amigxs, ex-namoradxs, ex-mortxs,
extrx-terrestres
Lembro ter passado no vestibular pra Jornalismo e, já com a
cabeça raspada,
Ter ido levar o convite da formatura do Ensino Médio pra uma
tia
Na ocasião, fui recebido por uma prima que me indagou:
“E aí, já conseguiu passar na segunda fase do vestibular?
Porque a primeira,
Você sabe, é peneirão e qualquer um passa...”
Mal sabia eu que minha cabeça raspada seria indagada, muitas
vezes,
Pela vida a fora: “Você venceu realmente?”
Se você esperar que o olhar alheio te declare vencedor, é
Melhor pôr na playlist o Tema da Vitória cantado por Tom
Jobim
E relaxar, deitado no pódio:
Porque sentado você se cansará
Nossa cultura está, contraditoriamente, acostumada a pensar
que o capim do vizinho é mais verde
E que a vitória alheia é “uma cagada”: expressão utilizada para
definir uma incerta região: misto de acaso e ocaso
Como se a vitória fosse algo irrepetível, um farol perdido que lança luz sobre alguém que,
No fundo, estaria fadado a ser tragado pelo mar da derrota
E, dessa premissa, deriva o tão conhecido adágio brasileiro: "Adiantou ter feito tamanha conquista e agora estar com um cisco no olho ou ter sido pego pela Lava Jato ou ter recebido um Impeachment ou ter perdido o primeiro lugar do Brasileirão do ano que vem?"
Dirão:
Passou no vestibular “na cagada”
No mestrado “na cagada”
Foi convidado para o New York Times “na cagada”
Chegou à pré-faixa preta “na cagada”
É muito burocrático ser vencedor, na cultura brasileira
Não adianta vencer simplesmente: é preciso agradar
diferentes bancadas
Passar num concurso é uma vitória?
“Parece que não, meu amigo, porque você é estéril e nunca
vai poder ter filhos”
Ou “Acho que não, brother, porque você não passou para o
concurso que eu passei
E mesmo que tivesse passado, não passou como eu passei: com faixa Black & Decker”
Chegaste à pré-faixa preta
Vitória?
“Não, porque você não é uma mulher bela, recatada e do lar
Nem tampouco um macho provedor”
São tantos pós-requisitos para ser um vencedor
Que, antes da champanha estourar, o pódio afunda,
E o segundo lugar é declarado, oficialmente, primeiro,
Até que o terceiro prove o contrário e, assim,
regressivamente...
E se você for bicha, negro, maconheiro, mulher ou homem
Vai ter de provar, de três em três horas,que suas vitórias
Não foram “na cagada”
Só quem não vence “na cagada” é o “pai macho de cada dia”
E a mulher que aceita ser seu apêndice:
Aí sim flutuará no salão, vitoriosa: como uma costela
A vitória, em nossa cultura,
Precisa, no mínimo, preencher, dez pós-requisitos:
- Ser uma prisão perpétua sem direito a fiança
- Ser fruto de uma indicação
- Ser conquistada à distância, fora do alcance dos olhos e do coração dos "admiradores"
- Ser televisionada ou rede-socializada
- Todas as alternativas anteriores de trás pra diante, num eterno looping.
Sigo, perguntando-me qual a cor da faixa que se deve
utilizar para tentar esconder
Nossa “pecaminosa” nudez
Ah, meu caro Antônio Vieira, que saudade do futuro onde ser
mais que vencedor
Era simplesmente combater o bom combate, sem tanta carreira,
e guardar a fé
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