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Nos episódios anteriores de Supernatural: Comprei, com cara de poucos amigos, uma rifa terceirizada vendida
pelo amigo Paulo Maciel para ajudar amigos dele que estão organizando a colação
de grau.
- Quais são os itens da cesta, Paulo?
- Uma garrafa de Champanhe, duas taças, chocolates, um
porta-retrato e uma Pelúcia
- O que é Pelúcia?
- Um urso de Pelúcia, oras ...
Daí por diante, durante duas semanas, fiquei ouvindo Paulo
propagandear a famigerada Pelúcia (leia-se Pilúcia). Confesso que exagerei na
antipropaganda, pois toda vez que alguém procurava meu amigo atrás de uma rifa
e perguntava os itens daquela cesta de Dia dos Namorados, eu me atravessava, desembainhava
uma metonímia e resumia o conteúdo dela a uma palavra: “Pilúcia”. E, todo
mundo, assim como eu, questionava: “Pilúcia, o que é Pilúcia?”.
Por ironia do destinacaso, estava eu, em pleno Dia dos
Namorados (hoje, por sinal), escrevendo uma reportagem, quando Paulo chega e,
ferido por um apostólico inconformismo, brada: “Né que esse miserávi ganhou a
Pilúcia, depois de ter esnobado completamente a bichinha”.
Durante uma hora, a sala inteira da Assessoria de Imprensa
riu da fatídica Pilúcia e, em meio aos risos, a tensão superficial do meu caos
se perguntava se era normal sentir-se um intruso de calendário, alguém acanhado
por fazer parte de um Dia permeado pelas cobranças associadas ao ideário
romântico gestado no século XVIII e adjacências. E, como é sabido por quem bem
o sabe, o substrato do acanhamento é o sentir-se incapaz de atender a altos
patamares de expectativas (nossas ou alheias).
A Pelúcia é uma personificação clássica do que costumamos
chamar de excesso de fofura, acionado em momentos estratégicos da linha do
tempo, a exemplo do Dia dos Namorados, nos quais fica exposta nossa fragilidade
diante da falta e do excesso bem como a dificuldade de sabermos a quem
direcionar nossas faltas e excessos.
Vem-nos aquele impulso de fofura reprimida – um gêiser doido
pra jorrar em forma cute-cute, dengos infantilódes, cosquinhas, narizes se
roçando e outros elementos que a vergonha alheia me impede de listar. O que
devemos fazer com esta vontade de potência reprimida, hein Nietzsche? E a
pergunta mais difícil: Onde achar uma vítima espontânea para se tornar alvo da
fofura represada?
A outra face da moeda da fofura é a aridez. Certamente talvez, existe um botão de Foda-se hibernando em nossa psique, um quê de indiferença e secura à espera do momento oportuno para aflorar despido de folha, flor, fruto ou culpa anexada. Mas, também nesse caso, nos espicaça a dúvida: Devo mesmo direcionar minha potência de aridez a este indivíduo? E se ele, sem que eu o saiba, for o amor da minha vida (mesmo que o “o da minha vida” tenha prazo de validade de uma semana?).
De todo modo, eleger os alvos de nossos excessos de fofura e
de secura é tarefa hercúlea. Até porque os alvos precisam praticar o que está
tipificado na poesia de Camões: “estar-se preso por vontade”. Só deixando-se
prender, por vontade – sem precisão de nenhum tipo de “atrás das grades” - suportamos os excessos de ternura e aridez
que, de quando em quando, visitam os relacionamentos.
E aí percebemos que a saúde do namoro não está ligada
somente aos gestos de fofura recíproca. É preciso administrar os descompassos,
principalmente quando uma das partes está sintonizada no excesso de fofura e a
outra no excesso de secura. Administrar este descompasso é o que reforça a
intimidade, afasta a vergonha e, por tabela, a potência opressora de satisfação
das expectativas.
Os excessos hospedam nossas carências e estão sujeitos a
chuvas e trovoadas de incerteza. Mas, diferentemente do que pensava
Aristóteles, um relacionamento feito só de equilíbrio é um ponto que perdeu o
paradeiro do final do texto. Excessos – desde que visitados pela disposição, pelo
carinho e pela boa-vontade – são administráveis e nos ajudam a lidar com a
humanidade que a idealização romântica tende a usurpar.
هل تريد أن تتعلم تحبني؟
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