30 de setembro de 2011

Sobre a necessidade de suicidários

Enforcado, mas feliz - Por Lucas Kotovicz (Kotó)
A família não quis revelar o sobrenome do rapaz, embora fontes oficiais confirmem que o nome dele era Judas (ou, Judaxxx, como diria Tico Santa Cruz.). Não se sabe se foi suicídio. Judas teria sido linchado por um grupo de pessoa no Sábado de Aleluia. (texto de Lucas Kotovicz, escrito como legenda para a foto acima).



Ontem, soube de mais um caso de suicídio, ocorrido no prédio do Centro de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Pernambuco: uma jovem que saltou do alto do edifício. Não soube por meio da imprensa, mas sim enquanto subia rumo ao 11o andar do CFCH. Pensei comigo: "se o CFCH fosse do tamanho do Centro de Artes e Comunicação (com apenas quase três andares), não haveria este problema!".

É incrível como este tipo de ponderação tacanha nos toma de surpresa.  Mas, ao ler o texto de Raphael Tenorio, percebo que o problema não é o CFCH erguido fora, mas sim o CFCH "dentro" de nós (para me fazer entender, sou obrigado a utlizar esta questionável topografia existencial legada pelo advento da sociedade burguesa).

Mas,fico a me perguntar (e, a respeito deste tema, sempre acho que as perguntas soam precárias) se a existência de uma "licença" para se matar ou de lugares para que isto aconteça "livremente" seria um avanço no enfrentamento desta questão. Pergunto-me se a saída é criar novos lugares sociais ou reformular a arquitetura dos já existentes. Mas esta é realmente uma inquietação e não a utilização da interrogação como fórmula retórica de afirmar pré-conclusões.

Acho que, na verdade - e também na mentira -  independentemente de estar ligada ao suicídio, a morte não tem lugar específico porque sempre está em cena, ou quem sabe, é obscena (no sentido etimológico de pairar ao fundo da cena).

Ao ler o texto de Raphael, lembrei das palavras de Walter Benjamin sobre como os vencedores não se cansavam de manchar a memória dos vencidos, mesmo depois que estes morriam.

Neste sentido, a existência de suicidários (espaços destinados à livre prática do suicídio) talvez conferisse uma legitimidade de escolha a quem comete este ato, evitando os gracejos e a piedade farisaica que se lança sobre a memória dos suicidas. Existe, certamente, uma necessidade velada de fazer dos suicidas extensões de Judas. Assim, cria-se um vínculo entre o suicida e o traidor, a fim de se eleger bodes expiatórios sobre os quais lançamos a sanha secreta pelo linchamento.

Porém, penso que a existência de suicidários não seja o ponto a ser explorado. Acredito que o que a sociedade precisa rever é o recrudescimento de discursos de cunho totalitário referentes à obrigação de se estar vivo, de ser feliz. E, claramente, neste caso,  "estar vivo" e "ser feliz" não são meras abstrações, mas sim o redirecionamento para um plano transcendente de determinados modelos do se estar vivo e feliz.

Neste ponto, a questão social se encontra com a existencial, visto ser cobrado das pessoas adaptar-se a determinados modelos de existir, sem que haja condições materiais de se aproximar deste modelo. Creio que ao menos uma parcela dos suicídios seja decorrente da conjugação entre a pressão dos modelos sociais de perfeição, a falta de condições objetivas de alcançá-los e a subjugação da potência "interior" de criação e reformulação do ideário de felicidade e vida.

Acho que o suicídio começa, em certa medida, quando se torna insuportável a tirania de um determinado modelo de estar vivo.

Mas, o ponto final desta reflexão é meramente fictício. Isto se é possível haver uma ficção que possa ser chamada de mera.

Confira o texto Suícídios no CEFCH - soluções materiais para problemas existenciais?, escrito por Raphael Tenório (criador do neologismo "suicidário") no blog Um ano Existencialoide.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...