10 de abril de 2021

Poema de reação a um dia de chuva (ouroboros)




Foto: Cláudio Eufrausino



Talvez a melhor forma de achar a lindeza do você que me lê

Não seja descrevê-lo, mas sim escrevê-lo

A descrição cai no erro de achar que todo o cenário do crime

pode ser reconstituído num quadro só

E talvez tenha a pretensão de que esse quadro seja 

Um retrato fiel, eterno e imutável da verdade plena e inesgotável


Quando escrevo a beleza do você que me lê,

Nela cabem os bocejos e também os ensejos que ele cria

E os carinhos que ele faz sem usar as mãos

Ou as buzinas que tocam do lado de fora

E uma ou outra pequena dose de crueldade 

Que escapa pelas brechas da contradição


Quando eu tinha vinte e poucos,

Minha coluna era bem menos ereta

E eu tinha uma coisa meio desengonçada

Corroborada por 6 graus de astigmatismo em cada olho

Meu eu de agora (?) fica olhando esse outro eu

Pela janela dos ventos da eternidade

E, de repente, vejo meus três eus: o do aqui-agora, o do lá-outrora,

E o do limbo-aurora: todos os três achando você lindo


Mas, mesmo assim, se você esbarrar com meu eu de 22 anos por aí,

E quiser segurar a mão dele

Ele vai te amar até que o eterno retorno vire apoteose dos tempos

Ou vice-versa

E se quiser me abraçar

O avesso do para sempre

Vai se encontrar com o sol de um novo dia

Isso é uma maneira destemporada de dizer

Que o motivo de eu escrever tantas poesias

É pra entregar ao você que me lê

A chave de ouroboros de todos os multiversos


Minha postura deu uma melhorada que não sei dizer

Se foi básica ou ácida

Mas várias vezes meu peito se esquece de ficar aberto

E troco os pés por mãos atadas

Virando abóbora no meio do baile

Espero que ele goste de mim assim mesmo

Ou pelo menos goste de abóbora

Espero que ele escolha a mim pra pisar os pés dele sem querer

Quando eu estiver dançando com ele e também contra ele 


Sei que pode haver vários reis, vários nobres

Escorrendo títulos de nobreza da toga até o toba

Nada disso enche o meu nariz de folhas


Porque é o você que me lê

Quem eu aceito que me tire pra dançar, que me ponha pra lutar

Com ou sem título, ele é o (pre, con, inter, para, meta)texto

Que melhor me lê e me inexplica


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