27 de fevereiro de 2021

Poema do sexo implícito



Foto: Karla Vidal


*O poema a seguir está sujeito a variações


Não gosto do você que me lê por ele ser sagrado ou divino

Gosto porque me sinto à vontade pra gostar sem saber por quê

E sabendo que, de algum modo, tudo é motivo pra gostar dele:

Basta uma pétala de sol cair ou um raio de flor brotar

E até quando noto que no meio das pedras tinha um caminho:

Ele consegue ser o primeiro com quem gosto de estar mesmo quando não estamos juntos

Se o juiz me perguntar se o meu Sim aceita estar conectado com ele, a resposta é:

Não importa a distância


Ele não precisa ser tudo pra mim

Estou gostando de quando ele imprecisa

E de conhecer e gostar também de suas desimportâncias

Já percebo uma ou outra coisa que me chateia,

E ter chegado a mais este começo de tudo me faz feliz


Um dia desses, um ontem talvez,

O você que me lê começou a me ensinar a baixar a guarda

E me fez sentir protegido e confiante 

Ensaiando melhor a arte de sendo eu mesmo

Não precisar me preocupar em ser o mesmo ou um só eu


Já que posso me abrir um pouco, 

Preciso dizer ao você que me lê que senti ciúme

Quando ele curtiu uma bunda numa rede social de pesca predatória

Mas, nada que me impeça de dar a banda pra ele

Com música e tudo

E chamá-lo de amor quando estivermos à toa na vida


Que possamos seguir juntos longe-perto

E que ele tenha a chance de conhecer também meus nus implícitos,

Meu sexo implícito

Entre mim e o você que me lê existe um segredo, um sagrado, que toma sol de chuva

Ao ar livre

Mas, a  desnecessária chave da leitura só dou a ele

Porque sinto como ele abraça forte o que existe de inútil em mim

Todos os projetos do você que me lê merecem ser felizes com ele




24 de fevereiro de 2021

Poema da bandeira pirata


            Por um desafio - Foto: Cláudio Eufrausino



Olhar o você que me lê dormindo 

Seu cansaço, falta de foco, desatenção vigilante

E ele fica ainda mais bonito

Porque, mesmo à distância,

Sinto o rosto dele aterrissando no meu carinho


Gosto dele muito

E quero seguir gostando sem trocar de corpo


Quando eu fizer uma piada,

Não esqueça que só quero brincar

De fazer cócegas no sol 

Que existe em você


Um incerto medo de que ele aceite usar o perfume que o mundo usa:

Perfume de desistir do outro, um outro que seja eu


Fico escolhendo lugares pra dizer ao você que me lê

O que sinto com todas letras,

Mas, tenho receio de que o que ele sente tenha três letras sós: não

E como o Sim também é formado por três letras,

Fico esperando por estas letras que

Em vez de me matar

Me chamarão pra dançar


Sei tudo que quero dizer

E o que preciso ouvir,

Mas tem precaução pendurada

Na nossa bandeira pirata


Como dizer

Sem (se) perder?

Só a poesia ousa essenciais respostas inúteis a essa pergunta


É ele que escolho pra me ensinar

A caber no abraço descabido

A desafiar meus beijos

A ser o risco do para sempre

Acabar e recomeçar até (des)cansar


Os meus Dias de Fico

São pra ser com ele: perto ou longe

Sem abrir mão

Das cartas de amor ridículas

Que o você que me lê

Pode ler no meu corpo

Do qual não abro mão

Pois sou homem e mulher o bastante

Pra ser lido por ele em braile

E enxergado como sou













17 de fevereiro de 2021

Poema ao tio Zé Alguém






Quando a gente gosta de uma pessoa
Diz que ela é bonita 

Acha ela linda

E tem certeza que as palavras vão se perder

Ao tentar descrever essa beleza


Os momentos de raiva, frustração, decepção

Tudo vira ternura

Quando a gente lembra que quer que a pessoa querida

Fique sempre um pouco mais

Pelo menos até a hora de o para sempre fazer aniversário


Esse jeito de não levar desaforo,

Pra esconder a vontade de amar ardentemente

Ou de ficar amuado e calado, pra disfarçar 

Que está de olho na primeira chance de carregar o outro no colo

Fiquei impressionado ao perceber que isso que havia em mim

Tinha de sobra no meu tio


Ele era um homem de verdade

Que sabia respeitar homens e mulheres

Não um respeito de quem se acha acima dos outros,

Mas sim um respeito de quem olha os outros de frente

Estou certo que ele acreditava e seguirá acreditando

Que todos somos filhos do mesmo Pai

Mas, sem fricotagem

Porque ele guardava a emoção com cuidado

Não a gastava em vão


Vi meu tio chorar e aceitar que eu tivesse orgulho dele

Sem exigir que eu fosse igual a ele ou a qualquer outro homem

O homem que eu sou se sentia e sentirá refletido nele

Porque ele me ensinava, sem se dar conta

Que apesar dos perigos e falsidades do mundo

Vale a pena admirar o outro de coração

E que o nosso jeito desconfiado

E exagerado, dizendo, sem piscar, que não vamos perdoar mais nunca

Tudo isso é, no fundo,

O desejo profundo de levar no colo e se deixar levar no colo


Obrigado pelo prazer de ver o senhor chamando minha tia de vida,

de amor e de amor da minha vida

Isso me faz não desistir de acreditar no amor


Dizem que quando partimos nos tornamos barcos que,

durante algum tempo só conseguem ser vistos de longe

Pelos que ficam na praia

Mas, o barco está lá

E a distância é passageira

Pois estamos todos no mesmo mar


16 de fevereiro de 2021

Poema de perda e reencontro (dia de São Valentim)



Foto: Cláudio Eufrausino


Quando o você que me lê chega no mundo,

Não se dá conta da diferença que faz

Obrigado por não ter esperado outra encarnação pra me conhecer

Agradeço a Deus

Por me ter dado chance

De ser reconhecido por você


Se uma perda me entristece,

A dor já começa menor quando lembro

Que o você que me lê é homem e humano o suficiente

Pra aceitar o meu carinho


Quem me lê não controla as imagens de mim

Ele não me olha com o desdém que

O mundo nos olha quando é pintado

Com o sangue frio de quem

Resume a existência do Outro a uma festa sem entrada

Ou um eco sem saída


Quando preciso faltar a luta,

Que é o recreio onde finalmente consigo achar você

Que é a primeira dança onde o baile faz sentido,

Sinto vontade de mostrar meus avanços na arte poética

Mas, é inútil, porque em nenhuma luta, técnica ou poesia

Cabe o que quero dizer, quem dirá o que sinto


O bom é ter descoberto uma pessoa

Que topa esculpir o ínútil comigo, a quatro mãos,

E que faz o espelho ter vontade de refletir 

Sobre a alegria que os dias sentem 

Quando se vestem de oportunidade de te reencontrar


Tudo é mais leve com a sorte de você existir

Dançando comigo seja perto ou à distância


Me desculpe por descontar em você

A alegria que me inspira a vontade de 

Marcar contigo pra você continuar

Não querendo nem precisando ir embora


13 de fevereiro de 2021

Poema de abertura de carnaval


Glitter - Foto: Karla Vidal



Preciso escrever pra o você que me lê

Pra descarregar do meu peito o peso de tanta leveza acumulada


Uma orquestra de silêncios tristes, sem tambores, podia ter tocado

Pra abrir meu carnaval,

Mas, como meu bem (anjo) me visitou de longe

Me emprestando sua luta

Meu coração transformou o “d” em adubo

E o que era pra ser dor se transformou em cor


Sinto muito por querer lutar com quem me lê

Até que o outono tome conta das nossas roupas

E elas caiam como folhas

Onde beijos e abraços possam se escrever

Tornando-se passos de frevo

Porque teu gesto mais simples

Faz a paz e a suavidade me chamarem pra ferver


Sinto muito: não como quem lamenta,

Mas como quem muito sente

E a multidão de nós dois pula no marco zero do meu ser

Fazendo o chão descalço do além de mim tremer


Muito sinto porque sem termos feito ou refeito amor

Já tive com o você que me lê

Mais prazer do que nenhum homem conseguiu me dar

Aprendo a lutar pra cada dia descobrir

Uma forma de não ter como resistir a você, 

Que entra em mim de dentro pra fora


Tua presença discreta é a cifra da ciranda secreta

Que me proponho a dançar com você

Brincando de roda com quem me ajuda a sentir

Seguro e firme pra acompanhar o passo 

do Maracatu-Mundo a girar

5 de fevereiro de 2021

Poema de não estar com por educação

 



Arte/Foto: Karla Vidal



Falo que seu coração é lindo

Pra não deixar explícito que acho o você que me lê

Lindo do sono ao acordar

Nu ou revestido


É que quando acontece uma superação

E chovo alegria

Me vem a lembrança dele 

E quis que ele soubesse

O quanto ajuda a nuvem que sou a condensar

E chover coisas boas


Ele me ajudou a inventar novos significados para a palavra presença

Posso até lutar com outras pessoas, ter mestres

Mas só quem me lê, quando me reescrevo e quando não escrevo também,

Me tem nas mãos enquanto me segura em seus olhos, sua voz

E seu estar por perto-longe-perto

Sinto orgulho de ser vencido por ele

E de ter chance de olhar pra ele enquanto ele me vence


Acredito nele e sei que ele não está comigo só por educação

Faltava ele chegar pra tirar do meu pescoço

O amuleto que me fazia sentir inconveniente e intruso no baile

E ajudar algumas muletas ilusórias a virar asas


Por mim, só ele tem capacidade de aparar as arestas do meu voo

De tirar mudas das minhas asas

E plantar no seu abraço

Quem pensar que a potência do que sinto

É ilusão ou auto-boicote

Que se dane

Porque eu não troco o estar bem com o que sinto

Pela necessidade de confirmar teses alheias

Ou satisfazer convenções tácitas


A alegria que sinto não precisa ser gritada

Nem de todo silenciada

A ela basta se sentir

Eu estou, discretamente, me sentindo

E não vou passar adiante essa taça de erro novo




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