8 de setembro de 2012

A natividade de Maria e a opinião estéril da Igreja sobre a fertilização in vitro

«Naissance de Marie» de Joseph Aubert
(Décor : intérieur d'une maison à Jérusalem)



Os evangelhos apócrifos são versões não-oficiais, das quais a Igreja Católica retira informações para subsidiar os quatro evangelhos canônicos. É por meio dos evangelhos apócrifos que tomamos conhecimento, por exemplo, que os pais de Nossa Senhora são Ana e Joaquim.

Estes mesmos evangelhos relatam que Sant’Ana era uma mulher estéril, mas que recebeu de Deus a graça de se tornar, já em idade avançada, mãe de Maria. 

Ao longo da história do povo judeu, existem vários casos em que Deus reverte a esterilidade. E as mulheres que são agraciadas trazem ao mundo pessoas que abrem caminho para grandes libertações. Assim foi com Ana, que gerou o profeta Samuel, que abriu caminho para que Davi se tornasse rei de Israel, unificando o povo hebreu. Mais de um milênio depois, outra Ana viria a ser mãe de Maria, que fez de seu próprio ser caminho para Jesus entrar no mundo. A prima de Maria, Isabel, também deixou de ser estéril e gerou João Batista, chamado de “preparador dos caminhos do Messias”.

A reversão da esterilidade traz como mensagem que Deus faz brotar, daqueles que o mundo dá por casos perdidos, o milagre e a salvação. Ele parece gostar de surpreender. E os milagres parecem ser um desafio a nossa tendência de subestimar os outros.

Só não compreendo como a natividade de Maria, hoje celebrada, não chama a atenção de certos setores da Igreja, que insistem em se posicionar contra a fertilização in vitro, considerada inadequada por não envolver o ato sexual. Mas, este tipo de tratamento médico não é uma reescritura, em termos científicos, do milagre divino que reverte a esterilidade?

Alguns argumentam que a fertilização in vitro é um processo “frio” e desprovido de afeto. Esse ponto de vista só faria sentido se resumíssemos a chama do amor ao acoplamento entre o os órgãos sexuais masculino e feminino, destinado à reprodução. 

De acordo com esta perspectiva tacanha, os estéreis não teriam o direito de amar, pois a relação entre eles seria “inócua”. Se eu estiver sofismando, por favor me corrijam! Mas, acho que sofisma maior é a insistência de uma parcela da Igreja em resumir a potência infinita do amor ao encaixe genital com fins de reprodução, confinando o que foge a este propósito à esterilidade sem direito ao milagre que habita quaisquer relacionamentos humanos.

A seguir, reproduzimos, em homenagem à Natividade de Maria, um trecho do Sermão do Nascimento da Mãe de Deus, escrito pelo padre Antônio Vieira:

Quereis saber quão feliz, quão alto é e quão digno de ser festejado o Nascimento de Maria? Vede o para que nasceu. Nasceu para que dEla nascesse Deus. (...) Perguntai aos enfermos para que nasce esta celestial Menina, dir-vos-ão que nasce para Senhora da Saúde; perguntai aos pobres, dirão que nasce para Senhora dos Remédios; perguntai aos desamparados, dirão que nasce para Senhora do Amparo; perguntai aos desconsolados, dirão que nasce para Senhora da Consolação; perguntai aos tristes, dirão que nasce para Senhora dos Prazeres; perguntai aos desesperados, dirão que nasce para Senhora da Esperança. Os cegos dirão que nasce para Senhora da Luz; os discordes, para Senhora da Paz; os desencaminhados, para Senhora da Guia; os cativos, para Senhora do Livramento; os cercados, para Senhora da Vitória. Dirão os pleiteantes que nasce para Senhora do Bom Despacho; os navegantes, para Senhora da Boa Viagem; os temerosos da sua fortuna, para Senhora do Bom Sucesso; os desconfiados da vida, para Senhora da Boa Morte; os pecadores todos, para Senhora da Graça; e todos os seus devotos, para Senhora da Glória. E se todas estas vozes se unirem em uma só voz, dirão que nasce para ser Maria e Mãe de Jesus" (Sermão do Nascimento da Mãe de Deus).

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