Fonte da imagem: Labsticky.blogspot |
O banheiro, não à toa, é habitado pelo eco (ou pela
reverberação, caso queiramos nos prender aos detalhes sórdidos da Física). Isto
porque ele tem o poder de amplificar. Pequenas frases, escritas nas portas,
capturam a atenção de nossos olhos sem precisar da ajuda de lupa. Nesse lugar,
brincam de roda curiosidade, controle e (parco) poder.
Dizem as más línguas, que banheiros são hábitat natural de
conversas femininas (será que esta ilação vem da mitologia grega, na qual Eco,
originalmente, foi uma mulher?), onde em vez de álcool se destilaria veneno (de
alambiques retocados de batom).
Mas, não é bem verdade. Tendo em vista que, pelo menos hoje
em dia, a produção de veneno se democratizou bastante e desconhece fronteiras de gênero. Quem vai ao banheiro de um Shopping, ou outro qualquer, e
tem a chance de ficar um pouco mais que os trinta segundos necessários para “Fazer
o número 1”, tem chance de testemunhar como banheiros se tornam lugares para
que as pessoas exerçam sua crueldade relâmpago, decretando penas, selando
destinos, reduzindo biografias a frase de (de)feito.
E, coitada de Eco, condenado a propagar a barbaridades de
banheiro e a ser desdenhada pela indiferença e crueldade narcísicas.
Nos corredores, a lógica é semelhante. Mas, parece que o
corredor é menos lugar de desabafo (ou desova) e mais um lugar de contágio.
Espera-se que a maledicência cultivada nos corredores seja incubada no ouvinte
e que, mais à frente em alguma alcova ou banheiro, o vírus incubado rompa o
invólucro da discrição e contagie o máximo número possível de “desavisados” ou de
pessoas que, vacinadas pela hipocrisia, torcem para que suas barreiras imunológicas
cedam diante do contágio da fofoca, único vírus que o doente convida para
entrar.
Os corredores parecem ser mais convidativos aos que querem
atribuir o mal aos outros. Já os banheiros parecem ser mais atrativos para
aqueles que buscam confessar o mal que desejam praticar, mas que, talvez, não
tenham de coragem de fazê-lo.
Nas conversas de corredor, não há santa que escape de virar
puta, nem trabalhador que escape de virar vagabundo. Nos banheiros, covardes
professam instintos homofóbicos, genocidas, misóginos, e outros tipos de
preconceitos ancestrais e torcem para que o mundo se torne nazista o suficiente
para abrigar seu ódio cego, como se o revérbero do banheiro estivesse condenado
a ser seu cúmplice, diante da impossibilidade de ser testemunha de acusação.
Mas, não será o corredor ainda pior, tendo em vista que
propaga informação sem ajuda alguma do eco, por meio do vírus da maledicência
incubado no silêncio omisso dos interlocutores?
Mas, há algo de semelhante entre banheiro e corredor: neles
nenhum o direito constitucional a ampla defesa e contraditório simplesmente
desaparecer: como se nestes dois espaços o Outro pudesse ser apagado, mesmo
continuando a ser o tópico da conversação; constrói-se uma atmosfera de precognição, de “profecia”
e se busca, ao menos discursivamente, fazer valer a Lei de Talião e outros
tipos de penas ainda que o objeto e autor do crime não existam. Banheiro e
corredor vivem de réus, independentemente da existência de crime.
No banheiro e no corredor, cultiva-se uma estranha
igualdade: todos são igualmente juízes, igualmente monarcas, igualmente Papas,
até que Eco prove o contrário...
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