Foto: Karla Vidal |
A morte não pôde Te manter preso
Ela pôde se olhar no espelho quando a tampa do sepulcro
pipocou
A morte, tão injustiçada e execrada,
Sentiu-se fazendo sentido
Vestiu-se de ponte
Os brincos eram uma pista de voo
Os ecos das maldições foram despedaçados
A maldição, que parecia beijar teus calcanhares,
Converteu-se em espuma de mar vertido da taça do crepúsculo
Uma voz interrompeu a Páscoa e me mostrou pessoas amadas
sendo
Atropeladas por infratores alcoolizados,
Sendo executadas
Estupradas
Banidas de seus países
Muitas crianças feridas, fugidas, antes de aprender o
significado da guerra sem sentido
A voz me pediu para ser eleita presidente
E tentou me comprar com um ramalhete de fuzis
De certezas efusivas
E me perguntou: e agora que é com você?
A voz acusou o beijo que ainda darei no meu grande futuro
amor
De querer acabar com a família, a honra, com a ordem e o
progresso
Com os raios fúlgidos do berço esplêndido
Era uma voz burra, porém convincente
A voz não se contentava de ver os mortos pregados na cruz
E lutava para convencê-los de que morrer não era o
suficiente
Para aplacar o nojo que sua existência inspirava
A voz era baixa, porém gritante
E acreditava, impiamente, que, sob sua vigilância,
A blindagem do sepulcro era infalível
De repente o silêncio de Nossa Senhora
Comoveu a rocha sepulcral
E um anjo chamado Metatron
Retirou uma onda de sua bainha
Uma espada que ensinou todas as armas
A desferirem
O salmo 90 dedilhou um acorde nos raios cacheados
De um sol que andava em pé de igualdade com a lua
E um beijo livre para o amor de qualquer maneira
Caiu como uma pétala de luva
A antiga voz, sem se dar conta,
Sorria porque a tampa do sepulcro
Havia descoberto que desde o início
Era reticências sem jamais desde sempre ter sido reticente
Cristo ressuscitado fez todos os estupros,
Homofobias, execuções e guerras desmoronarem
Suas vestes alvinegras respiravam o aroma de seus cabelos,
Cujas mechas eram feitas da luz de reencontros
Pôde a esperança enfim brincar à sombra do inexprimível
Da palavra vulcânica
Ao lado do Ressuscitado, o futuro amor, futuro do presente,
Que não se pode apagar, de graça, me chama
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