28 de agosto de 2016

Plagiando Otto Maria Carpeaux


Arte: Cafe Express


Me descobri numa quarta à noite plagiando Otto Maria Carpeaux

Consegui cem anos de perdão, exceto para as segundas e quartas-feiras

Que esperam que me convides a jogar o carro fora e te fazer companhia até a porta de tuas asas


Meu aikido anda meio sem jeito porque não consegue imobilizar a saudade

Não consigo mais cair. 

Pareço condenado a ficar de pé, firme, como uma queda d'água afogada em represa

E embriagada de deserto


Sinto falta do teu chegar perto

Do teu não saber uma palavra em japonês

E, mesmo assim, traduzir meu cansaço para o idioma do sol nascente


Com um kaiten, dei trêsvolta ao mundo

Mas, meus braços não acham espaço para emprestar meia volta ao redor do teu corpo

Então, aproveita essa fraqueza gravitacional, essa dor plagiada de Carpeaux

E volta



23 de agosto de 2016

Poema bebido durante um engarrafamento


Foto: site Sobre Vinho


Em trânsito



Não te olhar hoje evitou que minha pupila tivesse um infarte obtuso

Escolha qual opção me resta: pensar que estive o tempo todo enganado ou que sou louco

E convença o Descartes que mora em mim de favor a  reler a lenda de Tell e refazer sua máxima:

"Penso, logo mentes"

Que vontade de te descartar, de abrir o peito e dizer: Sou feliz como nunca

E fingir que o passado é uma infração ultraleve, que não conta pontos,

Mas, loucura mesmo é esperar que, em sã consciência, advirtas-me

Sem escrita, lei, edital

Obrigando a liberdade a publicar uma resolução

Onde abraçar deixa de ser sinônimo de dirigir na contramão

Amanhã, devo amanhecer sem esta vontade doída de ir embora de mim

Porque a carteira de habilitação do sol disse "Dane-se" à categoria

E suspendeu meu direito de desistir de amar por tempo indeterminado

Antes que o engarrafamento cesse

Antes que a lágrima de açúcar descongestione meu sentido do olfato

Espero me encontrar contigo no fim de semana

E tomar um cálice de vinho sem porto


22 de agosto de 2016

A mulher que fez o papel de Bertolt Brecht numa peça escrita por Galileu Galilei



Foto: Folha da Região


"Quem de nós não teve de negar o óbvio para seguir adiante?" Como boa discípula de Brecht (se é que isso é possível), Denise Fraga sabe que esta pergunta é ao mesmo tempo dela, do próprio Brecht e de Galileu Galilei a quem ela trouxe de volta à vida no palco do Teatro Santa Isabel entre os dias 18 e 21.

E assim como Galielu,  a mulher vem enfrentando tribunais de inquisição para mudar o retrato de um sistema petrificado onde a figura do macho insiste em continuar sendo o centro de um universo onde empiricamente homens e mulheres são estrelas que brilham em pé de equidade.

Como é sabido por quem bem o sabe, Galileu precisou renegar sua teoria para escapar de ser morto pela inquisição

E um tédio mortal está prestes a me fazer desistir de continuar a escrever esta postagem

Afinal, por que escrever se nada me garante que as pessoas vão enxergar o que quero que elas enxerguem?

O espetáculo consegue, durante mais de duas horas, reacender em quem assiste um dilema que nossa época-zap parece ter dado por encerrado: ouvir a voz da razão ou a voz da conveniência? Mas, logo esse questionamento percebe que precisa de outro mais profundo para não se resumir a um conflito de ego. O beco sem saída de Galileu parece apontar para o problema de como o conhecimento humano, mesmo aquele de ordem física ou matemática, envolve o questionamento da ética vigente

Em uma das cenas da peça, Galileu conversa com um padre dividido entre o amor a Deus, o amor à Igreja e a paixão voluptuosa pela ciência. O religioso indaga se a pesquisa científica não deveria se podar de revelar certas verdades que pusessem em risco o alento que a ilusão representa.

Galileu desejava que as pessoas julgassem o que acreditavam pelo que vissem e reinventou o telescópio para ampliar esse poder de visão. Mas, a encenação redireciona o telescópio de Galilei para dentro de nós onde nada é óbvio ou provável. Ganha ainda mais peso a angústia de optar entre crer no que faz sentido ou sucumbir ao alento das ilusões

Nesta perspectiva, a verdade impressa em nossos sentidos, nos prazeres palpáveis, teme vir à luz do dia ameaçada pela tranquilidade mesquinha do sentir-se seguro em meio a um cenário de valores escleróticos, mas detentores do passaporte de uma segurança com passagem só de volta para a conveniência, isto é, para o não sair do lugar.

Denise Fraga e os demais atores fazem brilhantemente o papel de Bertolt Brecht, mas merecem mais aplausos quando, sem perceber, fazem o papel de quem está assistindo. Os personagens acabam se tornando atores coadjuvantes e, por isso mesmo, roubam a cena, ou, melhor dizendo, a tomam de empréstimo.

Queria emprestado de Galileu o olhar que deu coragem ao telescópio de questionar o céu e te emprestar um pouco desse olhar para teres coragem de ressuscitar o copérnico sentimento que o índex da conveniência e do medo amarram no cansaço de teu coração

11 de agosto de 2016

Heliotropismo e a saúde dos planos



Foto -  Flickr Hive Mind



Girassó

Heliotropismo
Descobri que fui infectado por esta cura
Quando estava andando pelo DETRAN na véspera de um tempo por greve indeterminada
Coisa séria, porque hoje, circulando pelo Órgão
Lotado de ausências, o heliotropismo atacou com mais força
Furando a greve, meu olhar tentava ir na tua direção,
Lutando pra driblar um sol claustrofóbico que se intrometia entre nós

Os girassóis também planejam paralisar suas atividades
E me pergunto onde vou conseguir antídoto para o heliotropismo que eles transmitiram pra mim
E me respondo: o novo Termo de Referência do plano de saúde do DETRAN
Cortou as vagas na UTI para os girassóis,
Que não poderão mais ser internados ao ar livre
Só poderão ser atendidos no hospital-lua, que,
Por força do decreto de um usurpador
Só operará em fase minguante

O meu olhar que te olhou ontem
Precisa urgentemente de uma dose de emergência
Conseguir uma receita para adquirir um novo encontro contigo
Em algum lugar longe do barulho ensurdecedor desse DETRAN vazio

Eu nem podia imaginar que o remédio pra o heliotropismo se chamava
Encontro Marcado: tarja cor de galáxia

8 de agosto de 2016

O desclassificado vencedor olímpico


Foto: Danilo Verpa/Nopp


Esse isso que sinto desquebrará todos os recordes
Porque a lembrança doce é uma deixa para o ouro perdido subir ao pódio
Esse Eu te amo, nocaute que te coloca de pé,
Lutador peso ultraleve (peso-voo)
Tem por sobrenome um pedido Hipólito de desculpa
E nome de lamento vencedor: Rainbrown
Desculpo-me como um atleta que ultrapassa a si mesmo
Na prova mais difícil: o revezamento 1 por todos de mim

Meu olhar prefere ser desclassificado
Não consegue evitar de queimar a largada
Pra não te perder de vista
Olhar desclassificado e medalhista
Coração ferido, vem ser o estranho intervalo apelidado vitória
Porque ser é maior que vencer
E ganhar é me perder na vigília do teu son(h)o

Enquanto teu ressono medalha o colo do meu peito

4 de agosto de 2016

Como plantar amor no esquema da agricultura sintrópica


Amor- perfeito (Viola x wittrockiana) ©Sabor de Fazenda


Beijo sintròpico

Como é decidir parar de chorar
Quando a libertação lembra como é não desistir de você?

O futuro cansou de ser tolo e resolveu dar um tempo na sua mania de perseguição
O espelho perdeu a vergonha de me olhar
E as paredes ficaram surdas
Pra que nosso segredo ficasse completamente à vontade
Pra nos assistir inventando o nascer do sol
E refazendo a nossa primeira vez
Quantas últimas vezes forem necessárias

Quando você disser sem dizer que talvez tenha medo de que eu insista
Serei capaz de provar que minha insistência é cúmplice de mim mesmo?
Não pinte seu quadro de mentiras com as tintas da minha voz
Nem cante a aceitação alheia com notas de uma música composta por ti para ser minha

Até breve porque mesmo a teu lado parece que estamos separados por um ciclo de mil existências
Devolva seus abraços de banda pra loja de conveniência

Porque meus beijos são fruto da agricultura sintrópica
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